quinta-feira, 10 de abril de 2014

Sobre "Ela", de Spike Jonze, mas sobre nós também

Joaquin Phoenix é um desses atores meio incompreendidos de Hollywood, especialmente depois de ter ido se aventurar no hip-hop, após anunciar sua aposentadoria como ator (o que, em seguida, alegou ser parte de uma personagem criada para um documentário). Fosse verdade ou não, e felizmente para nós, ele voltou em grande estilo, no mais novo filme de Spike Jonze, Ela, e ninguém seria mais adequado que ele ao papel de escritor de cartas que se apaixona por um sistema operacional num futuro apocalíptico bastante próximo.
Tudo porque Ela é um filme sobre desajuste e solidão, que, ao que tudo indica, são quase regras na atualidade. De alguma forma, por essa temática, Ela me lembra Quero ser John Malkovitch, do mesmo Spike Jonze, especialmente a primeira cena, em que o melancólico titereiro John Cusack se confunde com sua arte. No entanto, Ela ainda tem esse toque contemporâneo da tecnologia que pode nos afastar cada vez mais uns dos outros e fazer desejar o impalpável como encontro ideal.
Theodore, o sensível escritor de cartas (quase uma coincidência com Dora, a escritora de cartas da Central do Brasil no filme de Walter Salles), apaixona-se por Samantha, um sistema operacional intuitivo, presentificado pela voz rouca de Scarlett Johansson. Ao longo da narrativa, pairam dúvidas sobre a necessidade ou não de um corpo para que haja uma relação, e até o sistema operacional se humaniza de tal maneira que chega a ferir seu parceiro humano - será esse o sinal de sua evolução?
No cenário apocalíptico próximo mostrado por Jonze, os transeuntes conversam com seus respectivos SOs, e não com quem passa por eles - como temos visto hoje pelas ruas, cada pessoa entretida com seu smartphone, tropeçando nas demais por viver já em um mundo à parte. Ou seja, o apocalipse é já, é agora.
Como sobreviver a ele? As personagens de Joaquin Phoenix e Amy Adams encontram a resposta em uma prática ancestral: relacionar-se novamente com o outro, falho, muitas vezes mesquinho, mas inimitavelmente humano.

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