segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Me gusta Buenos Aires

Avenidas amplas e arborizadas, prédios oitocentistas bem conservados, gradis art-nouveau, cafés e livrarias impressionantes em toda parte, muitos brasileiros aqui e ali. Estávamos em Paris?
Quase: os fileteados nas portas das livrarias e na traseira dos ônibus, as lojas de alfajor, medialunas acompanhando o café, as casas de tango e tantas cositas más não podiam deixar dúvida - enfim tínhamos chegado a Buenos Aires. A chegada foi tão mais triunfal pela tensão que a antecedeu: pelo vulcão chileno, que podia despertar a qualquer momento e que tinha já nos levado a remarcar a viagem, e pelo atendimento ruim das Aerolíneas Argentinas (o voo não constava no site do aeroporto e nem no da própria empresa; até o último momento pairava sobre nós a ameaça do cancelamento). Chegamos a ouvir de uma atendente que não poderia colocar uma etiqueta de "Frágil" na bagagem porque as Aerolíneas não se reponsabilizam pelo que possa acontecer durante o voo (!!!).
Tudo isso, claro, foi compensado pelo nosso primeiro contato com a cidade, logo ao amanhecer, desde a vista aérea - que confirma localmente a teoria de que as cidades da América espanhola são construídas como uma malha quadriculada; não por acaso, tudo em Buenos Aires ficava "a cuatro cuadras" - até a caminhada em busca de um café, antes do check-in no hotel, pela Avenida de Mayo, ainda vazia, toda nossa.
Depois do primeiro café (que não é lá grande coisa) com medialunas (que são ótimas) fomos ao Teatro Colón, onde já nos integramos à visita guiada pelo portentoso prédio do século XIX, que pode abrigar até 3.000 pessoas em um único espetáculo. Outra coisa impressionante é como os guias locais são bem preparados - não só conhecem a história da cidade como ainda são politicamente articulados. Aliás, os portenhos se mostram muito politizados o tempo todo, e até as eventuais pichações nos muros da cidade têm conteúdos políticos (nada de "Sicraninho Z/S" ou "Fulaninho esteve aqui").
O atendimento nos restaurantes é, de modo geral, muito bom. Os garçons (mozos) no melhor estilo Velha Guarda são simpáticos, dão dicas, tiram fotos, como os do Palácio de las papas fritas (na Calle Florida), do Café Tortoni e do La parolaccia (em Puerto Madero). Ninguém tem pretensão de falar português, mas todos se esforçam em entender - o único problema era quando, de tão simpáticos, desatavam a falar e não entendíamos nada. Com sua inclinação à comunicação fácil, teve portenho que até cantou pra nós - um motorista de táxi nos mostrou seu CD de música brasileira, cuja letra não entende mas canta perfeitamente. Tivemos que desiludi-lo quanto a uma canção que achava "muy linda" (= romântica) e que na verdade falava de um tal Ricardão... 
Quanto aos mitos sobre Buenos Aires, lá não é o tal paraíso das compras de que se fala. É bom para comprar algumas coisas - artigos de couro (um casaco masculino custa cerca de 850 pesos, o que hoje custa quase 350 reais, ótimo negócio), malhas de cashmere (é preciso procurar - os preços variam de 150 a 370 pesos). Alpaca de verdade é raríssima; a maioria dos artigos de alpaca é feita de material misto. O doce de leite mais barato é o das lojas da rede Havanna, mas o melhor que provei é o Salamandra. Comprar em La Boca é caríssimo, e não dá para andar no Caminito, vejam que contradição, tanta gente há por lá, especialmente nossos compatriotas, atuais queridinhos dos vendedores, que já entendem que "cartón", e não tarjeta, é cartão de crédito (contribuições ao castelhano) e aceitam pagamento em real. (Aliás, por que será que já ouvi de tanta gente elogios ao Caminito, como se fosse a melhor coisa de Buenos Aires? Por onde - e como - esse povo andou?)
Já beber vinho vale muitíssimo a pena - sai mais barato (uma garrafa custa 21 pesos no supermercado) que tomar café ou água (ambos a 12 pesos nos restaurantes). Também come-se bem com 100 pesos por pessoa, incluindo cubiertos (couvert), uma taça de vinho, prato principal e sobremesa. Andar de táxi é outra coisa que compensa - praticamente atravessamos a cidade por 25 pesos.
Claro que a maioria dos turistas que vimos estava comprando a valer, invadindo lojas, formando fila para conhecer o Café Tortoni (que é lindo, mas perde feio para a Confeitaria Colombo, no Rio), enlouquecendo nas fábricas de couros de Boedo (um Brás local mais arrumadinho) e até em alguns outlets micados em San Telmo.
Fizemos algumas opções comuns, como ir à La Bombonera (que abriga o Museu de la Pasión Boquense, hermano do Museu do Futebol), à belíssima Catedral Metropolitana, passar em frente à Casa Rosada, jantar em Puerto Madero (um dos visuais mais incríveis da cidade). Mas em vez do show de tango para inglês ver fomos visitar as exposições do Malba (um Georges Pompidou contemporâneo) e batemos perna pela cidade, desbravando lugares menos turísticos, como a Manzana de las Luces, um edifício do século XVIII onde se reuniam os "iluministas" locais e que oferece passeios pelos subterrâneos da cidade, e as livrarias mais antigas, como El Ateneo e Libreria d'Ávila. E penso que, assim, mergulhando na cidade, conhecemos sua verdadeira alma, simbolizada pela enorme fila de pessoas se inscrevendo para o Festival de Tango, por pessoas tomando sol sentadas na grama, pela multidão curtindo o feriado de libertação da Argentina por San Martín. Vimos que o glamour portenho convive com os sinais visíveis da crise, como faixas de protesto, gente morando nas ruas, automóveis velhos e muitas, mas muitas mesmo, placas de "vendese" e "alquiler". 
Mas, por isso tudo, Buenos Aires, como seu flan con dulce de leche, deixa um gostinho de quero mais.

Desde o alto: interior da Libreria d'Ávila; flan con dulce de leche, nova paixão; interior do Teatro Colón; Puerto Madero; Café Tortoni; hace frío en San Telmo; cena familiar no Malba; placas de aluga-se no alto dos prédios da Calle Córdoba.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Meninos, eu vi - Banda Black Rio

Um pouco de proselitismo para começar: o tempo passa, e continuo fã do Sesc, pela sua organização e pela qualidade da programação oferecida, a preços acessíveis.
Nossa última incursão foi ao Sesc Pompeia (o meu favorito), para ver a lendária Banda Black Rio, com nova formação e desfilando por estilos musicais diversos. Mas a verdade é que a qualidade é a mesma e a Black Rio continua colocando todo mundo para dançar. Foi uma delícia ver toda aquela multidão, inclusive membros da Velha Guarda soul,  rememorando passos de funk (por favor, nada a ver com o de cachorras, popozudas ou o quê) e de samba rock, embalada pelo vocal elástico e afinadíssimo de Jadiel Oliveira, dividido quando em vez com o tecladista William Magalhães. Bateria enérgica e criativa; contrabaixo para lá de competente. O trio de metais, perfeito!
Não havia como corpo e alma não saírem mais leves dali, depois de terem testemunhado a passagem da alegria e se esbaldado de dançar.


A Black Rio voltou à cena musical com William Magalhães, filho de Oberdan Magalhães, criador da banda na década de 70.

Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

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