Acabo de assistir a Jojo Rabbit, filme do neozelandês Taika Waititi (que, aliás, merecia o Oscar de melhor maquiagem por sua transmutação de bronzeado maori para o desbotado Adolf Hitler), baseado no romance Caging Skies, da também neozelandesa Christine Leunens (mais uma obra feminina adaptada ao cinema). Ri e chorei com a saga do pequeno membro da juventude nazista que se apaixona pela jovem judia escondida em sua casa e tem um amigo imaginário chamado Adolf e nenhuma destreza para a guerra. Um pouco de fábula e ironia pode ser mais eficiente que um chamado à razão para se enxergar o mundo louco e retrógrado em que temos vivido há tanto tempo, e que volta e meia se repete a si mesmo. Sobretudo se tiver uma paleta à la Wes Anderson nos ambientes internos para realçar a narrativa.
Sinto o mesmo que senti, guardadas as devidas proporções, quando assisti a Corra!, de Jordan Peele. O escancaramento do racismo de forma tão absurda parece ser a única maneira de mostrar a existência dele a quem se nega a enxergá-lo no dia a dia. É preciso beirar o ridículo, a alegoria, para que todos enxerguem.
Não se enganem, porém: o entretenimento é só um verniz desses filmes. A crítica histórica e social é muito mais pungente em histórias aparentemente despretensiosas ou com toques de fantasia, como vemos em outras obras cinematográficas - o expressionismo alemão, por exemplo - e também em obras literárias e teatrais - logo me vêm à mente Murilo Rubião, Kafka e García Márquez e as peças de Ionesco e Beckett. Isso para não falar das artes plásticas em diversos momentos.
Bendita arte, que nos salva diariamente de uma cegueira iminente.
sábado, 29 de fevereiro de 2020
Alegoria e ironia para fazer ver - Corra! e Jojo Rabbit
Marcadores:
arte,
cinema,
contemporâneo,
crítica,
fascismo,
filmes,
papel da arte,
racismo
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Tudo de bão
Cabeceira
- "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
- "Geografia da fome", de Josué de Castro
- "A metamorfose", de Franz Kafka
- "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
- "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
- "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
- "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
- "O estrangeiro", de Albert Camus
- "Campo geral", de João Guimarães Rosa
- "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
- "Sagarana", de João Guimarães Rosa
- "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
- "A outra volta do parafuso", de Henry James
- "O processo", de Franz Kafka
- "Esperando Godot", de Samuel Beckett
- "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
- "Amphytrion", de Ignácio Padilla
Nenhum comentário:
Postar um comentário