quarta-feira, 28 de agosto de 2024

"Todas as coisas maravilhosas", com Kiko Mascarenhas

Não me lembro de já ter dito o quanto eu amo o teatro. Meninota, fui protagonista de um texto escrito pela professora de Português da 5a série - eu era um caipira contador de histórias, Bastião, que evocava personagens do folclore brasileiro que iam surgindo diante do público, formado pelos alunos de todos os horários de nossa escola de periferia. Muito antes disso, eu amava recitar poemas nas datas comemorativas, desde a 1a série, e o teatro consolidaria esse desejo de unir gesto e palavra. Meu encantamento diante do presente que se desenrola diante de nossos olhos é completo e começou nessas pequenas histórias. Sempre que pude, fui ao teatro me deslumbrar com essa mágica que só acontece na nossa presença, que depende dela para ser completa. Fiquei muito tempo, nos últimos anos, sem assistir a uma peça, mas depois que me mudei para Salvador comecei a compensar essa falta.
Foi uma amiga de faculdade, Valéria, que contou em seu perfil que havia visto a peça com Kiko Mascarenhas, Todas as coisas maravilhosas. Eu comentei que gostava muito do ator, que conheço de papéis secundários na TV, mas sempre com uma atuação divertida e próxima. Daí pensei que, quando fosse a SP, se a peça estivesse em cartaz, eu iria vê-lo em cena. 
No dia mais frio da minha viagem, rumei para o Tuca saindo da Liberdade, achando que talvez não chegasse em tempo, mas o motorista operou um milagrezinho, e cheguei às 16h58 ao teatro, quando Kiko estava no palco cumprimentando e abraçando pessoas, dando instruções para que o público chegasse mais perto. 
E em seguida a magia se fez. Fomos chamados a participar daquela história, cada vez mais acreditando que tudo era verdade. Estávamos dentro, inclusive porque a luz nos iluminava igualmente, sem maiores efeitos cênicos. Que maneira delicada de falar de temas difíceis, como depressão e suicídio! Em tudo, víamos esperança, a possibilidade de vida e riso apesar de.
Ao final, pudemos pisar no palco, ver as relíquias da personagem, inclusive a lista de coisas maravilhosas. E Kiko ficou ali para oferecer um abraço a quem quisesse. Eu fui, eu quis dizer a ele do milagre, do encantamento que ele tinha acabado de proporcionar, pura obra da graça. Que abraço bom, como se fôssemos amigos de longa data! Fora do palco, ele continuava me dizendo, naquele abraço, que as coisas vão melhorar. Obrigada, obrigada!

Peripatética em Sampa

Fui a SP para tratar de questões familiares e acabei encontrando amores que eu não via há muito tempo, como Carlos (desde 2011) e Karen (desde 2018). Com a amplitude térmica ainda maior, vivenciei a alternância de onda de calor (32 graus) e friaca (9 graus), algo mais comum nestes tempos de emergência climática (uma das amigas que queria ver, Lu Salgado, não pôde me encontrar porque a cidade de onde vinha estava tomada por incêndios, um risco imenso nas estradas). Passei frio, mesmo tendo me preparado para as baixas temperaturas de metade da semana.
De todo modo, consegui ver minhas pessoas, resolver imbróglios para mamis, cantar, dançar, rir, ouvir, comemorar conquistas (como de Marisa, com quem depois fui andando até o Ceuma, para ver Wisnik falar de Bosi), compartilhar heranças e alergias (com irmãos, é claro). Andei muito, da zona leste à sul, recordando caminhos de cujas grandes distâncias não me lembrava (como as avenidas que ligam Itaquera a Penha). Experimentei docinhos mil (Speranza, Itigo Itiê, Mori Chazeria, Biscoitê, Aizomê), tentei evitar o café em excesso, mas em Sampa é impossível, tudo e todos pedem café, e ainda ganhei uma degustação surpresa e exclusiva no Starbucks, com direito a dois baristas presentes, que elogiaram meu "palavreado". Aproveitei para revisar minha câmera e presenciei a GCM expulsando os moradores de rua com jatos d'água na Sete de Abril. Renovei cabeleira, comi bastante sushi (todo mundo anda na vibe de comida oriental, segundo Emersom, uma nova onda de cultura japonesa tomou a cidade e conheci um novo restaurante, Shigueo), mas mantive a tradição de ir à Speranza com as thelmas. Comprei coisas de que não precisava na Liberdade, de artigos de papelaria da Haikai a chás da Casa Bueno e do Azuki. Provei croissant com creme de amêndoas na Beth Bakery, trouxe um sourdough pra casa, além do pão davvero italiano que Eli me deu, sequíssimo, que deve ser umedecido por 10 segundos. Revi filhotes das amigas, como os altíssimos filhos de Marise e as três graças de Eliane, que carreguei no colo, me inteirei dos projetos de Rafaela, conheci a mamislinda de Marise. Enfim, fui à Japan House, onde, além de exposição sobre moda japonesa, conheci a linda embora pequena biblioteca e o banheiro à la Perfect Days; dali, voltei ao antigo espaço de trabalho do IC, onde estava rolando a Ocupação Naná Vasconcelos e uma exposição de Guto Lacaz. Até ao teatro fui, ver Kiko Mascarenhas em Todas as coisas maravilhosas, dica de Valéria, minha amiga de faculdade, mas isso vale outro post. 
Foi uma viagem divertida e produtiva, mas concluí que não caibo mais nessa loucura por vencer o tempo e as distâncias, esse "batidão" alucinado. Eu segui no fluxo alucinado, como todos, ligando minha tecla SAP, mas cheguei exausta em casa. Vi como não foi fácil para os amigos me encontrarem, por mil razões, mas especialmente pela corrida diária própria da megalópole, da qual já fiz parte, correndo muito. No momento, não me vejo voltando, mas só seguindo em frente, num passo mais tranquilo, seja para onde for.

Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

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