segunda-feira, 27 de junho de 2011

Redescobrindo Woody Allen

Há épocas em que parece não haver nada de interessante no cinema; há outras, felizmente, que nem sabemos a qual filme assistir, tantas são as opções!
É o que tem acontecido nos últimos dias. Entre quatro filmes igualmente atraentes, acabamos escolhendo o último de Woody Allen a estrear por aqui, Meia-noite em Paris.
Não bastasse a delícia de passear pela noite de Paris com o protagonista (Owen Wilson, em ótima interpretação), nos deixamos levar pela aparente leveza da trama, que tem muitos momentos divertidos e até abusa de alguns estereótipos "turísticos" (aquilo que todo mundo TEM que conhecer ou espera encontrar em Paris). Se Woody Allen parece querer satisfazer o público dando pistas óbvias das personagens (por exemplo, uma das músicas mais conhecidas de Cole Porter tocando em um bar dos anos 20 anuncia nosso encontro com o próprio compositor), também se diverte com as informações básicas que qualquer um que se pretenda sofisticado TEM que ter. Nada disso impede, claro, que nos divirtamos com a breve e ótima performance de Adrien Brody como Salvador Dalí.
Olhando mais fundo, enxergamos uma camada de crítica ao tempo que se vive e também à idealização de outras épocas, outros lugares, outras vidas, a essa saudade do não vivido. E talvez tenha sido justamente esse recorte de sentimentos comuns, pincelados com humor e esperança - com sutilezas, mas sem excesso de ironias e dobras psicológicas -, que fez tão agradável minha redescoberta de Woody Allen.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Meninos, eu vi - Ney Matogrosso e Banda Isca de Polícia

Vi, ouvi e amei, mais uma vez, Ney Matogrosso.
Desta vez, com o auxílio luxuoso e poderoso da Banda Isca de Polícia, que eu conhecia de discos - era simplesmente a banda que acompanhava Itamar Assunção.
Ao vivo, tinha ouvido apenas alguns de seus componentes em carreira solo, como Suzana Salles e Vange Milliet. Mas é impressionante a mágica que se instaura quando eles se reúnem, como as duas vocalistas parecem uma só voz em diferentes alturas. E o que dizer das guitarras blackispowerful de Jean Trad e Luiz Chagas? A bateria de Marco da Costa e o baixo do também arranjador Paulo Lepetit inundam o espaço como uma deliciosa cobertura sobre uma sobremesa à base de morangos. Para incrementar mais ainda o banquete, a participação de Bocatto.  
E lá de um cantinho veio ele. Ney. Discretíssimo, em princípio, vestindo preto. Mas logo tomando o palco todo com "a sua presença", derrubando as cercas com seu vocal quase inumano de tão perfeito - mas não celestial, como o de Milton Nascimento; talvez até luciferino. Reinventando a si mesmo a cada música do repertório de Itamar.
Com a plateia do Sesc Vila Mariana em êxtase, ele terminou de arrebatá-la derramando, e não mais cantando, "Sangue latino", seguido por Suzana e Vange.
O show acabou, e a voz de Ney e a música da Isca continuaram vibrando dentro de nós. Pura mágica.


Juro que nas fotos acima vemos Ney Matogrosso e a Banda Isca de Polícia!

sábado, 18 de junho de 2011

Boas razões para termos saúde

1. A gente se sente muito bem, que óbvio!
2. A vida se torna atraentemente desafiadora.
3. Nos sentimos mais aptos para os desafios!
4. Nos sentimos mais queridos pelas outras pessoas (porque, convenhamos, são poucos os bons samaritanos que têm paciência com os adoentados).
5. A mente, um tantinho egoísta, pode se concentrar em desenvolver boas ideias, pois não está ocupada com o sofrimento do corpo (do qual ela normalmente só se lembra quando falta a saúde).
6. Não sofrer com filas em hospitais, consultórios, nem com médicos mercenários, não vocacionados etc.

Etc.

E só vejo um aspecto positivo de perdermos (momentaneamente, s'il vous plaît!) a saúde: percebermos nossa fragilidade e o quanto precisamos (não "dependemos") uns dos outros.

domingo, 5 de junho de 2011

Mais cinema argentino - "O homem ao lado"

Quem não viu, por favor, vá ver. O homem ao lado, de Mariano Cohn e Gastón Duprat, é uma excelente película argentina. Já disse aqui que gosto de cinema argentino? Pois então, este filme de 2009 é um daqueles felizes casos de obras que nos fazem pensar em outras, não no sentido da imitação ou simples releitura, mas no caminho do diálogo enriquecedor.
Não foi por acaso que Daniel Araóz como vizinho intrometido me fez pensar por um momento em Paulo Miklos-titã-invasor (no filme de Beto Brant), ainda que o primeiro assome mais humano e bonachão. Também pensei, desde a resenha de duas linhas, que nos esperava uma espécie de pesadelo kafkiano - um dia, um vizinho resolve construir uma janela que dá para dentro da casa do outro etc. etc.
Mas, por mais absurda que pareça a situação apresentada, a coisa é mais real do que se poderia crer à primeira vista. Mesquinhez, intolerância, idiossincrasias são desnudadas por uma câmera que valoriza um zoom narrativo e tomadas plásticas, sendo a janela apenas uma metáfora daquilo que somos convidados/obrigados a ver - a ferida aberta de uma sociedade frívola e desigual. Que já estava lá, o tempo todo, às claras, na casa de vidro modernista, para quem quisesse (eu disse "quisesse") ver. Mas foi preciso o incômodo, o estranho, o estorvo para que houvesse a revelação. A crise.
Como bônus, o silêncio completo da plateia consternada, ao final do filme. Teremos todos visto a mesma coisa?

Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

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