quinta-feira, 31 de outubro de 2013
segunda-feira, 28 de outubro de 2013
Coisa de mulherzinha ou Quando a alma grita
Engraçadas essas coisas da alma, né? Tem coisa que você sempre soube, que sabia que estava lá, meio oculta na sombra, mas ali ficou durante anos e anos. E muitas vezes é preciso ajuda, uma lanterna alheia para iluminar a coisa "ensombrada" (vem daí a palavra "assombrada", sem nenhum acaso).
Algo que tenho trazido à luz, que estava louco pra sair do escuro, era um lado mais feminino da alma. Além de eu nunca ter tido uma educação de "prendas" (algo que, de qualquer modo, já não era tão comum entre as meninas da minha geração), desde cedo tive minha sensibilidade e minha criatividade cerceadas pela figura paterna. Para me adequar/sobreviver, sempre mostrei meu lado mais forte, combativo - que é ótimo, que me ajudou a ir mais longe do que talvez fosse de outra forma. Mas que não sou eu inteira.
Aí, de uns tempos para cá, a alma começou a fazer barulho. Muito barulho. A mandar mensagens misteriosas (lembrei de O mundo de Sofia!) que me faziam ter vontade, de uma hora para outra, de dançar. Eu, que nunca fiz balé e afins. Algo que nunca desejei? Não - sempre achei lindíssimo, sempre me pegou pelo ventre, não o balé, mas danças mais terra a terra como o flamenco. E de repente fui fazer uma aula, pensando comigo mesma: se não levar jeito, tudo bem, desisto. Afinal, levo jeito? Na verdade, não me preocupo mais com isso, nem penso em ser bailaora, mas AMO quando consigo olhar só para dentro de mim, quando a imagem no espelho vai desaparecendo, tudo ao redor vai se esvaindo e só ouço os sons dos tacones e sinto os movimentos dos meus braços, pernas, cintura.
A alma, porém, continuou seu ruído: ela queria mais. E lá fui eu fazer sumiê - uma busca até então inconsciente da ancestralidade, talvez a parte mais yin dessa minha ancestralidade, já que a outra parte era tão presente e tão afirmativa, yang mesmo. Descobri/entendi de onde vinha um tipo de comportamento, encontrei uma atividade que me obrigava a respirar, a esvaziar a mente, a ficar completamente presente. Assumi minha habilidade-sem-técnica manual, artística.
Alguns dias depois, outra mensagem misteriosa: quero bordar! Fui ao armarinho, como já contei aqui, e, munida de meadas e agulhas, me pus a inventar coisas, ainda sem nenhuma técnica. Um ponto de cada vez, e as imagens foram se formando. Para meu espanto, ouvi dizer que estava bonito. Outra atividade que me colocou em contato comigo mesma, mas que agora trazia à tona minha criatividade. Claro que é angustiante que o flamboyant demore tanto a ficar pronto, mas criar não é algo que esvazia: parece um olho d'água rompendo o solo seco e se transformando em um fio, um rio, um mar. Lavando, nutrindo, comunicando.
Não por acaso, isso foi aparecendo quando comecei a dar mais valor à minha intuição, a perceber o que a vida estava me dizendo. Coisa de mulherzinha. E quanto ainda há a perceber, entender, mais que "aprender". Quanto mais sei sobre mim, sobre meus tesouros enterrados, mais sei sobre o outro, sobre as "civilizações" que são diferentes da minha. Acho que agora começo a entender, a ouvir o grito da minha alma, e da alma do outro protestando quando uso a minha medida para avaliar os seus valores. Já não acredito mais em alteridade, que seja possível se colocar no lugar do outro, mas acredito cada vez mais no encontro, que, quando desejado e completo, é algo maravilhoso.
Algo que tenho trazido à luz, que estava louco pra sair do escuro, era um lado mais feminino da alma. Além de eu nunca ter tido uma educação de "prendas" (algo que, de qualquer modo, já não era tão comum entre as meninas da minha geração), desde cedo tive minha sensibilidade e minha criatividade cerceadas pela figura paterna. Para me adequar/sobreviver, sempre mostrei meu lado mais forte, combativo - que é ótimo, que me ajudou a ir mais longe do que talvez fosse de outra forma. Mas que não sou eu inteira.
Aí, de uns tempos para cá, a alma começou a fazer barulho. Muito barulho. A mandar mensagens misteriosas (lembrei de O mundo de Sofia!) que me faziam ter vontade, de uma hora para outra, de dançar. Eu, que nunca fiz balé e afins. Algo que nunca desejei? Não - sempre achei lindíssimo, sempre me pegou pelo ventre, não o balé, mas danças mais terra a terra como o flamenco. E de repente fui fazer uma aula, pensando comigo mesma: se não levar jeito, tudo bem, desisto. Afinal, levo jeito? Na verdade, não me preocupo mais com isso, nem penso em ser bailaora, mas AMO quando consigo olhar só para dentro de mim, quando a imagem no espelho vai desaparecendo, tudo ao redor vai se esvaindo e só ouço os sons dos tacones e sinto os movimentos dos meus braços, pernas, cintura.
A alma, porém, continuou seu ruído: ela queria mais. E lá fui eu fazer sumiê - uma busca até então inconsciente da ancestralidade, talvez a parte mais yin dessa minha ancestralidade, já que a outra parte era tão presente e tão afirmativa, yang mesmo. Descobri/entendi de onde vinha um tipo de comportamento, encontrei uma atividade que me obrigava a respirar, a esvaziar a mente, a ficar completamente presente. Assumi minha habilidade-sem-técnica manual, artística.
Alguns dias depois, outra mensagem misteriosa: quero bordar! Fui ao armarinho, como já contei aqui, e, munida de meadas e agulhas, me pus a inventar coisas, ainda sem nenhuma técnica. Um ponto de cada vez, e as imagens foram se formando. Para meu espanto, ouvi dizer que estava bonito. Outra atividade que me colocou em contato comigo mesma, mas que agora trazia à tona minha criatividade. Claro que é angustiante que o flamboyant demore tanto a ficar pronto, mas criar não é algo que esvazia: parece um olho d'água rompendo o solo seco e se transformando em um fio, um rio, um mar. Lavando, nutrindo, comunicando.
Não por acaso, isso foi aparecendo quando comecei a dar mais valor à minha intuição, a perceber o que a vida estava me dizendo. Coisa de mulherzinha. E quanto ainda há a perceber, entender, mais que "aprender". Quanto mais sei sobre mim, sobre meus tesouros enterrados, mais sei sobre o outro, sobre as "civilizações" que são diferentes da minha. Acho que agora começo a entender, a ouvir o grito da minha alma, e da alma do outro protestando quando uso a minha medida para avaliar os seus valores. Já não acredito mais em alteridade, que seja possível se colocar no lugar do outro, mas acredito cada vez mais no encontro, que, quando desejado e completo, é algo maravilhoso.
domingo, 20 de outubro de 2013
Receba as flores que eu lhe dou
Ontem foi a comemoração de 80 anos dos pais da minha grande amiga Karen. A festa aconteceu num clube antigo na Penha, entre amigos e familiares, tudo no maior capricho. Flores nas mesas, sapatilhas para a mulherada cair na pista, acessórios para compor o look dançante, bom serviço de bufê. E os dois, dona Enide e seu Ney, lindos, amados, alegres, comoventes.
Não bastasse a emoção de participar de um momento tão especial e perceber que o tempo escorre mesmo pelas mãos (afinal, eu os conheço há mais de 20 anos), vi ali, mais uma vez, o milagre do amor e da amizade, que acontece apesar da convivência, da rotina, das idiossincrasias de cada um. Apesar dos filhos e netos e amigos e desafetos, apesar dos dissabores e obrigações, apesar do próprio tempo. Acima das dúvidas e por isso mesmo sob um céu de dádivas. Cada um aceitando o outro também com seus defeitos e as flores que traz consigo.
Particularmente, acho cada vez mais difícil que um relacionamento dure tanto tempo, sobretudo em uma época tão volátil quanto a nossa, de coisas mais e mais virtuais e menos palpáveis. Nem Vinicius de Moraes, um revolucionário em seu tempo ao desejar que o amor fosse eterno enquanto durasse, seria capaz de imaginar a que ponto chegamos - talvez um ponto final seguido de vírgula...
Mas eu concordo com o poetinha (que faria aniversário, vivo estivesse, por esses dias) - que enquanto valer a pena o amor seja vivido intensamente, eternamente, com todas as fichas na banca, com todos os riscos (menos o de se perder de si). Pode ser que não sobreviva à própria vida, mas quem sabe? Dona Enide e seu Ney estão aí para mostrar que também é possível valer a pena por muitos e muitos anos.
Não bastasse a emoção de participar de um momento tão especial e perceber que o tempo escorre mesmo pelas mãos (afinal, eu os conheço há mais de 20 anos), vi ali, mais uma vez, o milagre do amor e da amizade, que acontece apesar da convivência, da rotina, das idiossincrasias de cada um. Apesar dos filhos e netos e amigos e desafetos, apesar dos dissabores e obrigações, apesar do próprio tempo. Acima das dúvidas e por isso mesmo sob um céu de dádivas. Cada um aceitando o outro também com seus defeitos e as flores que traz consigo.
Particularmente, acho cada vez mais difícil que um relacionamento dure tanto tempo, sobretudo em uma época tão volátil quanto a nossa, de coisas mais e mais virtuais e menos palpáveis. Nem Vinicius de Moraes, um revolucionário em seu tempo ao desejar que o amor fosse eterno enquanto durasse, seria capaz de imaginar a que ponto chegamos - talvez um ponto final seguido de vírgula...
Mas eu concordo com o poetinha (que faria aniversário, vivo estivesse, por esses dias) - que enquanto valer a pena o amor seja vivido intensamente, eternamente, com todas as fichas na banca, com todos os riscos (menos o de se perder de si). Pode ser que não sobreviva à própria vida, mas quem sabe? Dona Enide e seu Ney estão aí para mostrar que também é possível valer a pena por muitos e muitos anos.
quarta-feira, 16 de outubro de 2013
O grande encontro
Imagine chegar a um lugar onde nos esperam com sopa de abóbora à mesa e perguntam se queremos uma bolsa de água quente para aquecer um pouco mais a cama... Dormir ao som da cachoeira e acordar com pássaros cantando (e não terríveis pombas arrulhantes). Receber a cada dia ervas frescas para um banho purificador e também um suco desintoxicante (três vezes ao dia). Sentir cheiros deliciosos estrategicamente espalhados em cada canto, mas também curtir os odores mais campestres ao redor - não só o maravilhoso de mato molhado, mas até o do que as vacas obraram... Receber cuidados de fato, em um ambiente com tantos detalhes preciosos. Ver a névoa concentrada na mata subindo até se desfazer no céu azul. Poder caminhar em meio ao verde, fazer meditação conduzida por terapeutas competentes e delicados. Não é assim uma hospedagem econômica, mas uma viagem para o interior de si mesmo certamente não tem preço.
Cheguei machucada, carregando uma pesada bagagem de medos. Não digo que voltei novinha em folha, mas voltei inteira, íntegra, presente, com um alumbramento de quem sou eu. De que sempre tive coragem, mesmo que mal dirigida. De que meus sonhos eu é que devo seguir, de que aos meus caminhos eu é que devo dar curso. Voltei a respirar, vou aprendendo a usar toda a força dos meus pulmões. Joguei mágoas fora junto com as ervas do banho. Conversei aqui e ali com os dois outros únicos hóspedes, cada um com suas feridas, a gente se ajudando nos eventuais encontros, um sorriso (mesmo ainda não tão alegre, mas cada vez mais animado), um olhar de compreensão, uma história assemelhada. Bom o compartilhar em meio aos encontros e embates consigo.
E o contato com a natureza me faz lembrar como são sábios os outros animais, que dançam ao ritmo dela em vez de lhe fazer oposição, tão diferentemente de nós, que acreditamos controlar tudo, a natureza, a vida, os outros. Ao menos, estou procurando internalizar a ideia de que tudo pode ser bem mais simples, menos sofrido, mais natural, a própria nova vida que quero ter.
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domingo, 13 de outubro de 2013
Hora da faxina ou Prólogo/oração ao novo
Nesta época, costumo ir atrás da agenda do próximo ano. Procuro escolher uma que seja bonita mas minimamente discreta, prática e portátil. Com a agenda nova e em branco nas mãos, fico toda animada em fazer projetos, avançar um pouco mais na direção dos sonhos, pensar em algo novo a aprender/conhecer. Mas tenho pudores em começar a usá-la logo, já que o ano ainda não acabou e também há um balanço a ser feito, normalmente em dezembro.
Este ano resolvi fazer diferente. Comprei uma agenda maior, que lembra um livro antigo. Ela se inicia em agosto deste ano, e segue até dezembro do ano que quem. Resolvi já começar a usá-la, encostar a atual, assumir já o novo começo, o que me provoca desde agora um vital frio na barriga. Significa que já comecei meu balanço anual, também de outro jeito - um balanço não de realizações, mas das transformações. Sem arrependimentos, sem culpar o outro nem a mim. Buscando internalizar que a permanência é uma ilusão, como diz o artigo de Eugênio Mussak na Vida Simples. Assumindo o fim das etapas, sem lamentar toda energia gasta com elas - pois, afinal de contas, tudo foi porque valiam a pena. Já não valem mais, não na forma presente. Quem sabe o que será o amanhã? Mas não se pode deixar de caminhar por não saber o que há atrás da curva.
Faria tudo de novo? Nem tudo, mas quase, com o grande aprendizado de não me desgarrar de mim mesma mesmo fazendo o meu melhor pelo outro. E não deixar de fazer o meu melhor, talvez agora com o desconfiômetro ligado para saber a hora de parar. Não mais pelo temor de infância de ser inconveniente (apesar de toda minha extravagância aparente), mas para não usar desnecessariamente minha energia vital.
Certezas? De que alimentar expectativas acerca dos outros (de que nos deem o que não têm) é outra ilusão, mas que posso contar com os verdadeiros amigos e sobretudo comigo mesma. De que tudo será melhor do que tem sido, com as lições sendo absorvidas, trazendo mais cuidado e consciência (= iluminação). De quebra, e de preferência, em outro lugar, que me tire da zona de conforto que já me incomoda há tempos.
Assim, que venha o novo.
Este ano resolvi fazer diferente. Comprei uma agenda maior, que lembra um livro antigo. Ela se inicia em agosto deste ano, e segue até dezembro do ano que quem. Resolvi já começar a usá-la, encostar a atual, assumir já o novo começo, o que me provoca desde agora um vital frio na barriga. Significa que já comecei meu balanço anual, também de outro jeito - um balanço não de realizações, mas das transformações. Sem arrependimentos, sem culpar o outro nem a mim. Buscando internalizar que a permanência é uma ilusão, como diz o artigo de Eugênio Mussak na Vida Simples. Assumindo o fim das etapas, sem lamentar toda energia gasta com elas - pois, afinal de contas, tudo foi porque valiam a pena. Já não valem mais, não na forma presente. Quem sabe o que será o amanhã? Mas não se pode deixar de caminhar por não saber o que há atrás da curva.
Faria tudo de novo? Nem tudo, mas quase, com o grande aprendizado de não me desgarrar de mim mesma mesmo fazendo o meu melhor pelo outro. E não deixar de fazer o meu melhor, talvez agora com o desconfiômetro ligado para saber a hora de parar. Não mais pelo temor de infância de ser inconveniente (apesar de toda minha extravagância aparente), mas para não usar desnecessariamente minha energia vital.
Certezas? De que alimentar expectativas acerca dos outros (de que nos deem o que não têm) é outra ilusão, mas que posso contar com os verdadeiros amigos e sobretudo comigo mesma. De que tudo será melhor do que tem sido, com as lições sendo absorvidas, trazendo mais cuidado e consciência (= iluminação). De quebra, e de preferência, em outro lugar, que me tire da zona de conforto que já me incomoda há tempos.
Assim, que venha o novo.
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quarta-feira, 2 de outubro de 2013
"Gota d'água" com Simone e Milton Nascimento
Não sou muito fã de Simone, mas essa gravação de Gota d'água é insuperável!
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Tudo de bão
Cabeceira
- "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
- "Geografia da fome", de Josué de Castro
- "A metamorfose", de Franz Kafka
- "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
- "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
- "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
- "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
- "O estrangeiro", de Albert Camus
- "Campo geral", de João Guimarães Rosa
- "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
- "Sagarana", de João Guimarães Rosa
- "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
- "A outra volta do parafuso", de Henry James
- "O processo", de Franz Kafka
- "Esperando Godot", de Samuel Beckett
- "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
- "Amphytrion", de Ignácio Padilla