segunda-feira, 17 de abril de 2023

O pão do meu marido

Meu marido é um pão: todo mundo que conhece a gíria, sempre datada, para homem bonito, sabe disso. Mas o motivo do post é na verdade o pão feito pelo pão do meu marido. 
Sim, depois de muitos anos me vendo fazer pão ele resolveu realmente colocar a mão na massa, e não só pedir para eu ensiná-lo a fazer pão. Ele fez todo o processo, de pesagem, mistura, boleamento, produção do recheio das trouxinhas de maçã, acabou adicionando água a mais à massa, e ficou tudo uma delícia. A única coisa que fiz, além de passar a receita, foi pincelar um pouco de mel e água sobre as trouxinhas quando saíram do forno. 
O mais legal do aprendizado do pão é ver a alegria de quem aprende. Além da magia própria da transformação do alimento em comida, o pão é ainda mais encantador, com seu quê de surpresa e artesania. Impossível não se apaixonar. 

sábado, 15 de abril de 2023

Arte ao redor

Fico feliz demais em ter arte ao meu redor, inclusive trabalhos de alguns amigos que são maravilhosos artistas plásticos e fotos lindas feitas por Guga, que é um fotógrafo incrível. A maioria está na sala, que tem pé-direito bem alto. Mas tenho outras artes nos meus locais de trabalho, a cozinha e o escritório. Desde recuerdos de amigos, como azulejos ofertados por Wagninho e Welli e Lu, um bordado lindo que Marisa me trouxe do México e uma mandala feita por Jacob, um azulejo com poema de Gentileza, uma foto do saudoso Lilo Clareto, a placa feita por encomenda da Varanda Quadrada, o bordado volpiano da Artes da San e foto e bordado de minha autoria. 
É sempre essencial ter claro o que nos cerca. Nem tudo é fácil na vida, nem tudo é difícil, mas o que nos mantém em pé é o que importa, o que trazemos para dentro. A arte não é só essencial para mim, que sempre fui tão ligada a ela, mas para todas as pessoas - e chamo arte essa capacidade humana de criar e expressar-se, não apenas obras de artistas profissionais ou famosos. Criação é sinônimo de vida, e como é bom estar cercado de vidas o tempo todo, como é bom estar perto daquilo que expressa quem somos - um espelho íntegro para momentos em que nos sentimos partidos e também para reafirmar que estamos no caminho certo. 

Memória afetiva de rabanete e picles

Quando eu estava no pré-escolar, o prezinho (aquele mesmo localizado em uma praça onde eu me sentava com minha avó para comer meu lanche), fizemos uma hortinha sob o comando de tia Lídia. Simples, mas me deixou uma das lembranças mais doces da infância quando, um dia, fomos colher os rabanetes que tínhamos plantado (não me lembro de outras hortaliças). Deve haver uma foto, mas tenho que pedir a minha mãe. 
Há pouco tempo foi que me lembrei dos rabanetes, e percebi que quase não os consumia, mesmo tendo uma pegada oriental. Comecei a comprar de vez em quando, mas introduzido cru na salada não faz muito sucesso aqui em casa; tentei assado, mas tampouco agradou. No entando, outro dia, de posse de uma bandejinha, busquei na internet receitas com rabanete e topei com os picles de rabanete e cebola roxa do Panelinha da santa Rita Lobo (aliás, percebi que quando o Panelinha publica no Instagram qualquer rol temático de receitas eu já fiz pelo menos uma delas, ou seja, Rita Lobo é minha Dona Benta virtual).  
Então fiz o tal picles. Além de lindo, ele fica uma delícia com sanduíches e incrementando a salada. O gosto adstringente e adocicado me agrada muito, além da crocância - que são bem característicos de muitos alimentos fermentados, tão amigos do nosso sistema digestório. 

terça-feira, 11 de abril de 2023

Pavê de chocolate de Páscoa

Já faz uns anos que não compramos ovos de chocolate na Páscoa, sempre optando por uma sobremesa à base de chocolate, como este delicioso pavê da foto, receita da Panelinha, com biscoito assado direto no refratário (amo isso!) e então regado com calda de uísque, leite e canela e coberto pelas camadas de creme e creme de chocolate (com leite condensado caseiro, chiquérrimo) e merengue italiano, tudo polvilhado com chocolate em pó 70% cacau.
Mas, no entanto, todavia, este ano cometi a extravagância jupiteriana de comprar um ovo La Nut com pistache da Cacau Show. O mais caro que já comprei na vida, mas o que mais valeu a pena na vida. Jesus, que coisa deliciosa, tirando o açúcar adicionado e a gordura hidrogenada! Com pistache de verdade, pedacinhos inclusive. Deve ter sido a primeira e última vez, mas foi. 
E me acabei de comer chocolate nesta Páscoa - Toblerone, caixinha de Bis, ovão de pistache, pavê de chocolate. E agora chega, que quero eliminar mais quilos, depois de estacionar nos misteriosos 66,9 kg, com pequenas oscilações para cima e para baixo. De novo, vou iniciar uma fase sem açúcar adicionado e com menos farinha de trigo. Sigamos sem açúcar, mas não sem doçura.

quarta-feira, 5 de abril de 2023

Cuscuz marroquino a duas mãos

Numa conversa num dia qualquer, combinei com Dani fazermos um cuscuz marroquino para estrear seus pratos trazidos do Marrocos e sua tagine original.  Providenciamos ingredientes, houve um contratempo qualquer, agendas apertadas, pandemia e o encontro foi sendo postergado. 
Mas, outro dia, canceriana memoriosa que sou, trouxe à baila a ideia, Dani se reanimou com ela, encontrei o cuscuz no precinho. No encontro seguinte, ela já me avisou da compra do cordeiro, daí foi buscar lugar na sua agenda concorrida.
Fomos inaugurar seu novo cantinho na Praia do Forte, levando o preparo já adiantado - minha sogra preparou a carne com mil temperos, vinha d'alhos e tal, e eu deixei para refogar os legumes in loco, na cozinha pequenina, cuidando para não deixar voar cenoura e cebola pra todo lado (só não pude evitar as lágrimas dos convivas enquanto eu picava cebola). 
Depois, foi só magia: aquecer caldo, regar cuscuz, adicionar legumes e depois a carne desfiada, cobrir com hortelã e castanhas. Delícia, delícia o resultado do trabalho a quatro mãos tão longamente esperado.

Carla Madeira e a literatura que é rio

Outro dia, minha cunhada comentou sobre a entrevista de Carla Madeira no Roda Viva e disse que tinha se interessado em ler seu livro Tudo é rio. Lembrei-me de já ter topado com o título em algum momento e também ter me interessado pela história (que já não lembrava) e pelo título (porque, embora tenha medo de águas escuras de rio e um temor recente do mar, amo a imagem das águas). Ainda nem sabia que Carla Madeira, escritora e jornalista mineira, tinha se tornado uma das autoras mais lidas do país. 
Carol propôs então que todas nós (eu, ela, Nana e minha sogra) lêssemos o livro para conversar sobre ele. No meio de uma tarde de muito tédio com um trabalho chatíssimo, que já passou da hora de ter fim, comecei a ler. Não consegui parar até terminá-lo, em dois dias. 
A experiência que tive, de chegar às lágrimas, me fez lembrar de outros livros igualmente devorados. Eu ouviria as piores notícias dos seus lindos lábios, do Marçal Aquino, tem uma energia parecida, de encontro e desencontro de amantes, uma pitada de tragédia e uma ponta de esperança. Mas Tudo é rio tem mais personagens interessantes, todas construídas com um cuidado carinhoso da autora - a gente se sente próximo de todo mundo ali, quase adentrando as casas para um cafezinho. Embora não se diga onde se passa a história, imagino que seja em uma pequena cidade mineira. Talvez a casa de Manu pudesse abrigar a própria Hilda Furacão, mas abriga Lucy, a personificação do desejo sem limites. 
O livro de Carla foi além das minhas experiências intensas anteriores porque não me emocionou somente por identificação com a situação emocional de uma personagem (por exemplo, quando tirei da estante da biblioteca da FFLCH - que saudade daquela biblioteca! - A paixão segundo G.H. foi porque a lombada do livro praticamente se atirava sobre mim, e desde a primeira página foi um turbilhão, a liberação de um mar de lágrimas, pois Clarice falava diretamente comigo, naquele momento, naquela imensa solidão). Também não foi porque me identificasse com um aspecto específico das personagens - como a miopia de Miguilim em Campo geral, e os óculos que são passaporte para um novo mundo, uma outra viagem, agora sem o irmão e companheiro Dito. Poderia, talvez, dizer que Tudo é rio me provoca algo parecido com o experimentado em Ensaio sobre a cegueira, de Saramago, quanto ao poder de uma mulher, a única a ver, e a luz que há na solidariedade, que sempre, sempre me emociona - no livro de Carla Madeira, há mãe e filha com clarividência no sentir, portadoras do milagre do perdão.
O que quero dizer é que, para além das minhas conexões aparentemente forçadas entre este livro e os outros, o de Carla me tocou profundamente porque é tão bem escrito que nos leva a caminhar, amar, viver como as personagens, e essa sensação de adentrar uma história sem ser totalmente tomada por um tsunami há tempos eu não tinha. Não fui só levada pelas águas - o rio de Carla Madeira, mesmo com vórtices de paixão, me permitiu também nadar junto, respirar na superfície, descansando na narrativa (uma espécie de trégua?), e assim observar a paisagem ao redor e também a interior, sem perder um minuto de toda sua beleza. 

Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

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