domingo, 9 de agosto de 2020

Paus versus pais

Outra polêmica destes tempos pandêmicos e sombrios foi a que envolveu a campanha da Natura que coloca Thammy Miranda como exemplo de pai presente, junto com outros diversos pais, conhecidos ou não. Thammy aparece sempre em fotos com a esposa Andressa e seu lindo e feliz bebê Bento. Isso mesmo - Bento parece uma criança já felicíssima, cercada de amor, como deveriam ser todas as crianças.
Mas sabemos que não é assim. Centenas de milhares de crianças não conhecem seus pais, ou os encontram esporadicamente, ou são maltratadas e até abusadas por eles, ou sofrem com sua indiferença. Se nem toda mulher nasceu para ser mãe, com os homens acontece o mesmo - mas a sociedade não exige dos homens que participem tanto da criação dos filhos como as mulheres. Nem estou falando de pais e mães perfeitos, mas somente de gente que tope o compromisso, dividir as responsabilidades e tarefas cotidianas. Porém, no interior de uma sociedade machista como a nossa, muitos homens se limitam a ser paus, e não pais. 
E parece que é isso que importa - a representação da masculinidade, normalmente tóxica -, e não o comprometimento humano com o outro. Quando Thammy anunciou que estava participando da campanha da Natura, houve uma revolta dos machistas que não entendiam como uma mulher - eles não o reconhecem como homem trans - podia representá-los com o slogan "pai é quem cria". O que na verdade não podia representá-los é o próprio slogan, porque machistas convictos normalmente não são bons pais, não cuidam de ninguém a não ser de si mesmos. Setores conservadores da sociedade, especialmente da igreja, clamaram pelo boicote da marca. Acabaram vendo o efeito contrário, as ações da Natura subindo e a marca ganhando ainda mais projeção positiva.
Eu tive um pai nada presente, um pau autodeclarado, indiferente, arrogante e ciumento das atenções dadas aos filhos. Não queria nos legar nada, mas não pôde evitar a genética e até as heranças de seu desamor que transformamos como pudemos, cada um com seu cada um. Mas tive um avô, avôhai, seu Antônio Barbosa, gigante amoroso de olhos cinzentos, orgulhoso dos netos, conversador, justo. Não foi um bom marido para minha avó, mas esteve com ela até o fim na nossa criação. Pai é quem cria. Eu atesto, com amor. 

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Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

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