segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018
Rotas tropeiras
Leôncio, Santos, Rafael, Paulista, Bernardino, Domingos, Eça, Cubatão, Umberto, Rodrigues, Topázio, Polidoro, Diamante, Liberdade, Anhanguera, Marginal, Pires, Aclimação, Diamante, Conselheiro, Santa, Barros, Martim, Barros, Santa, Tesouro, Três, Higienópolis, Sabará, Sergipe, Consolação, Santos, Consolação, Paulista, Bernardino, Domingos, Eça, Cubatão, Umberto, Rodrigues, Topázio, Polidoro, Diamante, Aclimação, Getúlio, Tamandaré, Siqueira, Pirapitingui, Pedro, Mercúrio, Rosa, Paula, Florêncio, República, Luiz, Santa, Sé, Conselheiro, Pires, Bueno, Diamante, Bueno, Conselheiro, Tesouro, Liberdade, Bento, Paulista, Bernardino, Domingos, Eça, Cubatão, Rodrigues, Topázio, Polidoro, Diamante, Aclimação, Getúlio, Tamandaré, Siqueira, Pirapitingui, Liberdade, Santa, Barros, Martim, Barros, Santa, Radial, Cesário, Radial, Apucarana, Radial, Brigadeiro, Vergueiro, Polidoro, Diamante, Radial, Marginal, Dutra.
Cozinhar é um modo de amar os outros e a si
Cozinhar é um modo de amar os outros, diz Mia Couto. Talvez por isso eu sinta que fui claramente entendida quando alguém gosta dos meus pratos.
Mas, para além do amor ao outro, cozinhar é também amar a si mesmo. Quando, outro dia, fiz pão integral de aveia e mel e decidi torrar uma fatia e cobri-la com ricota, tomate, manjericão, nozes e um fio de azeite, senti o amor da minha comida chegando até mim. Mais que prazer, reconforto.
Quando isso acontece, sinto que tudo está no seu devido lugar, mesmo com todo o caos circunstante. Cozinhar ajuda, como a poesia, a reordenar o mundo.
Mas, para além do amor ao outro, cozinhar é também amar a si mesmo. Quando, outro dia, fiz pão integral de aveia e mel e decidi torrar uma fatia e cobri-la com ricota, tomate, manjericão, nozes e um fio de azeite, senti o amor da minha comida chegando até mim. Mais que prazer, reconforto.
Quando isso acontece, sinto que tudo está no seu devido lugar, mesmo com todo o caos circunstante. Cozinhar ajuda, como a poesia, a reordenar o mundo.
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quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018
Devagar e sempre
De pouco em pouco, fui pedalando cada vez mais longe. E por fim cheguei aos 50 km, na companhia do marido.
A forma como realizamos as coisas mostra muito de nós. Eu sei, parece óbvio. Mas penso, por exemplo, em como eu pedalo e como meu marido pedala. Ele gosta da velocidade, das trilhas íngremes, aquilo que ele já experimentava quando corria de moto. Eu prefiro ir cada vez mais longe, mesmo que não tão rapidamente. Ele é da explosão, eu sou da constância. Performance e endurance.
O interessante de pedalarmos juntos é como essas características se mesclam - para mim, o pedal fica mais intenso; ele fortalece a musculatura pedalando mais devagar. Como na vida, cada um aprende um tanto com o outro, mesmo que cada um tenha um jeito próprio de traçar seu caminho.
A forma como realizamos as coisas mostra muito de nós. Eu sei, parece óbvio. Mas penso, por exemplo, em como eu pedalo e como meu marido pedala. Ele gosta da velocidade, das trilhas íngremes, aquilo que ele já experimentava quando corria de moto. Eu prefiro ir cada vez mais longe, mesmo que não tão rapidamente. Ele é da explosão, eu sou da constância. Performance e endurance.
O interessante de pedalarmos juntos é como essas características se mesclam - para mim, o pedal fica mais intenso; ele fortalece a musculatura pedalando mais devagar. Como na vida, cada um aprende um tanto com o outro, mesmo que cada um tenha um jeito próprio de traçar seu caminho.
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segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018
O cinema de Guillermo del Toro em um mundo sem magia
Adoro os filmes de Guillermo del Toro: os poucos a que assisti já o colocam ao lado de Wes Anderson, Christopher Nolan, Pedro Almodóvar, ou seja, os bambas do cinema para mim.
O labirinto do fauno (2006) é um dos melhores filmes de todos os tempos - nele acontece o encontro da doce Ofélia com o fauno que habita um labirinto misterioso. O pano de fundo da Guerra Civil Espanhola muitas vezes salta do fundo e se mostra como a verdadeira fonte do terror experimentado pela protagonista. Fotografia, maquiagem, direção, roteiro, tudo é maravilhoso neste filme.
Já O orfanato (2007), dirigido por Juan António Bayona (aliás, diretor também de Sete minutos da meia-noite, lindíssimo) e produzido por Del Toro, é um thriller com temática já conhecida, a da chegada da personagem a um lugar assombrado (no caso, um lugar onde ela passou a infância), o que se complica com o desaparecimento de seu filho. Tudo seria mais do mesmo se não houvesse o cuidado da direção/produção (sim, porque há uma marca de Del Toro bem clara ali, como também em Sete minutos) em manter o terror no nível do inesperado, da insinuação, um terror "branco", sem sangue.
A forma da água, que este ano concorre a 13 Oscars, estreou há menos de um mês no Brasil, já cercado pelas polêmicas de plágio de uma peça teatral dos anos 1960. Fomos ver no dia mesmo da estreia e nos espantamos com o comportamento da plateia, ora apática, ora indignada com a "bizarrice" do filme, um longa de fantasia explícita à la Guillermo del Toro. O que vimos foi um filme belíssimo e comovente, de uma plasticidade líquida e profunda no seu chiaroscuro, com personagens solitárias e amorosas perfeitamente dirigidas. Aliás, esses três filmes têm em comum a solidão e o desajuste, além, é claro, da paixão de Del Toro por figuras monstruosas ou sem rosto e o fato de mulheres serem as protagonistas.
O diretor mexicano consegue transformar, por meio da fantasia, a solidão em encontro. Mas isso o público do cinema no shopping não conseguiu perceber, pois já se amalgamou a este mundo sem magia onde vivemos e (alguns de nós) resistimos.
O labirinto do fauno (2006) é um dos melhores filmes de todos os tempos - nele acontece o encontro da doce Ofélia com o fauno que habita um labirinto misterioso. O pano de fundo da Guerra Civil Espanhola muitas vezes salta do fundo e se mostra como a verdadeira fonte do terror experimentado pela protagonista. Fotografia, maquiagem, direção, roteiro, tudo é maravilhoso neste filme.
Já O orfanato (2007), dirigido por Juan António Bayona (aliás, diretor também de Sete minutos da meia-noite, lindíssimo) e produzido por Del Toro, é um thriller com temática já conhecida, a da chegada da personagem a um lugar assombrado (no caso, um lugar onde ela passou a infância), o que se complica com o desaparecimento de seu filho. Tudo seria mais do mesmo se não houvesse o cuidado da direção/produção (sim, porque há uma marca de Del Toro bem clara ali, como também em Sete minutos) em manter o terror no nível do inesperado, da insinuação, um terror "branco", sem sangue.
A forma da água, que este ano concorre a 13 Oscars, estreou há menos de um mês no Brasil, já cercado pelas polêmicas de plágio de uma peça teatral dos anos 1960. Fomos ver no dia mesmo da estreia e nos espantamos com o comportamento da plateia, ora apática, ora indignada com a "bizarrice" do filme, um longa de fantasia explícita à la Guillermo del Toro. O que vimos foi um filme belíssimo e comovente, de uma plasticidade líquida e profunda no seu chiaroscuro, com personagens solitárias e amorosas perfeitamente dirigidas. Aliás, esses três filmes têm em comum a solidão e o desajuste, além, é claro, da paixão de Del Toro por figuras monstruosas ou sem rosto e o fato de mulheres serem as protagonistas.
O diretor mexicano consegue transformar, por meio da fantasia, a solidão em encontro. Mas isso o público do cinema no shopping não conseguiu perceber, pois já se amalgamou a este mundo sem magia onde vivemos e (alguns de nós) resistimos.
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terça-feira, 6 de fevereiro de 2018
Espelhos, padrões e outras coisas pontiagudas
Estou terminando de ler a tetralogia napolitana de Elena Ferrante, pseudônimo de uma escritora contemporânea de língua italiana. Há quem diga que se trata de um autor, mas acho pouco provável, já que as navalhadas na carne ao longo dos quatro volumes (A amiga genial, História do novo sobrenome, História de quem vai e de quem fica, História da menina perdida) soam a uma memória feminina, mais crua que violenta, como os escritos de Clarice Lispector, Patricia Highsmith e Carson McCullers, em que pesem os diferentes estilos. Mas isso é assunto para outro post, a crueza feminina mais terra a terra, a crueldade masculina mais associada à cultura, segundo minha certamente modesta opinião.
Bom, o fato é que me vi nas histórias contadas por Lenu, protagonista e xará de Ferrante. Dentre outras questões, pela da autoimagem que constrói ao longo da vida, a relação com o próprio corpo e com o corpo do outro etc. Serei a única? Claro que não - Ferrante é o fenômeno que é pela capacidade de empatia que seu texto traz de forma tão fluida.
Eu mesma, por muito tempo, não gostei do que vi no espelho. Ou melhor, evitava me olhar nele porque só enxergava uma imagem indefinida, um borrão do que eu era. Talvez fosse a miopia, mas certamente era também uma recusa de si. Por outro lado, nunca quis me parecer com outra pessoa, ter outra aparência, outro corpo. A presença paterna também tornou complicado me reconhecer como mulher: era quase um sinônimo de vulgaridade; cuidar-se era sinônimo de idiotia e superficialidade. Também o apreço pelas artes, a leveza, a alegria, tudo isso foi sendo posto sob vigilância. Só queria me transportar por aí em um invólucro neutro, ser simplesmente aceita.
Porém, o mundo rejeita a neutralidade com seus padrões. Não se pode ser neutro, mas também não é desejável o ser diferente. A respeito da aparência, lembro-me de uma colega de trabalho ter dito que eu vestia bem todas as roupas por ser a pessoa com o corpo mais "regular", "proporcional", que ela conhecia. Na mesma época, visitando um brechó de um conhecido, experimentei uma blusa que não me caiu bem, mas serviu a outra colega, e tive de ouvir do dono do brechó, com a voz mais afetada possível: "É que você é fora do padrão, né?". Fiquei sem palavras. O que significava esse padrão? Cintura fina, bunda grande? Não há povo mais diverso que o brasileiro, e esse padrão a que ele se referia é uma falácia. Mas a fala fere, atravessa o invólucro, e tanta gente sofre por tentar se adequar ao suposto padrão e não conseguir.
Minha "cápsula protetora" contra as estocadas alheias acabou sendo o conhecimento; na verdade, um outro tipo de padrão que permite caminhar em freguesias diversas, ainda que não em todas. Afinal, dentro desse padrão, mesmo que mais amplo que o da aparência, ainda é preciso lidar com as questões "de classe".
A personagem de Elena Ferrante também acaba por descobrir que nada nos protege mais que a autoaceitação. Saber o que é importante de fato para si, auscultar-se. Talvez para a maioria das pessoas isso só venha com o tempo, com a tal maturidade, quando nos importamos cada vez menos com a opinião dos outros e conseguimos ouvir com mais clareza a voz interior. Uma pena que esse encontro tão importante e apaziguador possa demorar tanto a acontecer; por outro lado, as marcas que trazemos a essas alturas são o que nos distingue uns dos outros, torna-nos únicos e inutiliza (ou deveria) toda forma de comparação inútil.
Bom, o fato é que me vi nas histórias contadas por Lenu, protagonista e xará de Ferrante. Dentre outras questões, pela da autoimagem que constrói ao longo da vida, a relação com o próprio corpo e com o corpo do outro etc. Serei a única? Claro que não - Ferrante é o fenômeno que é pela capacidade de empatia que seu texto traz de forma tão fluida.
Eu mesma, por muito tempo, não gostei do que vi no espelho. Ou melhor, evitava me olhar nele porque só enxergava uma imagem indefinida, um borrão do que eu era. Talvez fosse a miopia, mas certamente era também uma recusa de si. Por outro lado, nunca quis me parecer com outra pessoa, ter outra aparência, outro corpo. A presença paterna também tornou complicado me reconhecer como mulher: era quase um sinônimo de vulgaridade; cuidar-se era sinônimo de idiotia e superficialidade. Também o apreço pelas artes, a leveza, a alegria, tudo isso foi sendo posto sob vigilância. Só queria me transportar por aí em um invólucro neutro, ser simplesmente aceita.
Porém, o mundo rejeita a neutralidade com seus padrões. Não se pode ser neutro, mas também não é desejável o ser diferente. A respeito da aparência, lembro-me de uma colega de trabalho ter dito que eu vestia bem todas as roupas por ser a pessoa com o corpo mais "regular", "proporcional", que ela conhecia. Na mesma época, visitando um brechó de um conhecido, experimentei uma blusa que não me caiu bem, mas serviu a outra colega, e tive de ouvir do dono do brechó, com a voz mais afetada possível: "É que você é fora do padrão, né?". Fiquei sem palavras. O que significava esse padrão? Cintura fina, bunda grande? Não há povo mais diverso que o brasileiro, e esse padrão a que ele se referia é uma falácia. Mas a fala fere, atravessa o invólucro, e tanta gente sofre por tentar se adequar ao suposto padrão e não conseguir.
Minha "cápsula protetora" contra as estocadas alheias acabou sendo o conhecimento; na verdade, um outro tipo de padrão que permite caminhar em freguesias diversas, ainda que não em todas. Afinal, dentro desse padrão, mesmo que mais amplo que o da aparência, ainda é preciso lidar com as questões "de classe".
A personagem de Elena Ferrante também acaba por descobrir que nada nos protege mais que a autoaceitação. Saber o que é importante de fato para si, auscultar-se. Talvez para a maioria das pessoas isso só venha com o tempo, com a tal maturidade, quando nos importamos cada vez menos com a opinião dos outros e conseguimos ouvir com mais clareza a voz interior. Uma pena que esse encontro tão importante e apaziguador possa demorar tanto a acontecer; por outro lado, as marcas que trazemos a essas alturas são o que nos distingue uns dos outros, torna-nos únicos e inutiliza (ou deveria) toda forma de comparação inútil.
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segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018
Tropeiros e garimpeiros
Graças à safra de bananas, recebemos Cris, Julio, Gleice e Wendel para um almoço temático em casa, o que resultou em um cardápio tropeiro-garimpeiro, eixo São Paulo-Bahia - como um dos convidados não gosta de banana, fiz, além do godó já planejado, um feijão tropeiro, aproveitando as carnes salgadas que tinha à disposição.
De sobremesa, fiz as broinhas sucesso de público e ambrosia, receita do meu livro de culinária da Chapada Diamantina (editora Senac). A ambrosia ficou maravilhosa, não sobrou nada pra contar a história. Na verdade, pouco sobrou da comida também - o godó foi devidamente reconhecido e apreciado, que bom!
A única coisa a lamentar é que esqueci de fazer fotos nossas - uma prova irrefutável de como a conversa foi boa e dinâmica!
De sobremesa, fiz as broinhas sucesso de público e ambrosia, receita do meu livro de culinária da Chapada Diamantina (editora Senac). A ambrosia ficou maravilhosa, não sobrou nada pra contar a história. Na verdade, pouco sobrou da comida também - o godó foi devidamente reconhecido e apreciado, que bom!
A única coisa a lamentar é que esqueci de fazer fotos nossas - uma prova irrefutável de como a conversa foi boa e dinâmica!
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domingo, 4 de fevereiro de 2018
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Tudo de bão
Cabeceira
- "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
- "Geografia da fome", de Josué de Castro
- "A metamorfose", de Franz Kafka
- "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
- "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
- "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
- "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
- "O estrangeiro", de Albert Camus
- "Campo geral", de João Guimarães Rosa
- "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
- "Sagarana", de João Guimarães Rosa
- "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
- "A outra volta do parafuso", de Henry James
- "O processo", de Franz Kafka
- "Esperando Godot", de Samuel Beckett
- "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
- "Amphytrion", de Ignácio Padilla