domingo, 27 de dezembro de 2020
sábado, 26 de dezembro de 2020
Barulhinho bom
Outro dia, assistimos a uma comédia britânica fofa, Questão de tempo, do querido Richard Curtis (Simplesmente amor, Quatro casamentos e um funeral, Notting Hill, Yesterday etc.) com o Bill Nighy e a Rachel McAdams. O protagonista, vivido pelo ator irlandês Domhnall Gleeson, poderia ser filho do Benedict Cumberbatch com o Martin Freeman, só que ruivo. Tudo adorável.
De repente, já ao final, meu marido me sai com essa: "Não tinha um ator negro nesse filme". Realmente não tem - todo mundo é branco, ou louro ou ruivo (só a Rachel McAdams tem cabelos escuros, e ela se refere a eles, num acesso de insegurança, como "too much brown", e também um rapaz que é meio mau-caráter e o chefe indiano meio escroto), ninguém tem problemas com grana, aliás, a família do protagonista tem uma casa maravilhosa na Cornualha, onde costuma tomar chá no jardim. Não há espaço para personagens negras.
Na verdade, o que mais chamou minha atenção foi meu marido ter indicado isso, até antes de mim. Significa que o barulho que os movimentos anti-racistas estão fazendo surte efeito, é capaz de mudar nossa percepção. Em 2013, ano em que o filme foi lançado, muito provavelmente não acharíamos - me incluo completamente nisso - tão estranha a falta de diversidade do elenco. Hoje é algo inconcebível, como também é bizarro que alguém não ache isso estranho.
Esse barulho necessário vale para todas as frentes que pregam igualdade e justiça social. Como os galos tecendo a manhã de João Cabral, uma tessitura linda e uma algazarra tão impossível de ignorar que só pode mesmo provocar mudanças, revolucionar uma época, refrescar olhares.
Entre presentes, nova receita de chocotone e celular carbonizado, enfim veio o Natal
Num ano tão atípico, o Natal parece que chegou ainda mais cedo. Fizemos o possível para nos antecipar e não precisar "frequentar" aglomerações desnecessárias em shopping ou supermercado. Estivemos somente nós mesmos, de novo no arranjo lindo à la Toscana que minha sogra sabe organizar tão bem.
Ganhei muitos produtos de beauté, de marcas diversas, o que foi maravilhoso, porque costumo usar tudo mesmo e já tenho um estoque para uns 3 ou 4 meses sem precisar me preocupar com sabonete, hidratante, perfume e batom. Também ganhei de minha sogra uma rosa-do-deserto, uma planta que sempre quis ter mas achava muito cara - neste ano, um verdadeiro símbolo de resistência ao que temos vivido.
Fiz as fotos dos meus presentes com meu celular para mostrar a diferença da qualidade dessas fotos em relação a fotos anteriores postadas aqui no blog. Isso se deu porque meu celular teve de ser remontado numa lojinha local depois de pegar fogo na mesma lojinha aonde eu tinha ido simplesmente trocar a bateria. Embora o rapaz tenha garantido utilizar na remontagem os mesmos componentes do modelo do meu celular, evidentemente a câmera não é a mesma. Todas as fotos ficam lavadas, mesmo com aplicação de filtro. Ou seja, tive de engolir esse prejuízo, ou ficar sem celular, ou ter de desembolsar, de última hora, uns mil reais num celular novo (já que o rapaz me ofereceu apenas 600 reais pelo carbonizado nas suas mãos - depois, é importante dizer, de ele ter tentado remover a bateria com o celular ligado e em curto). Nada que eu estivesse planejando, portanto, e que passa a fazer parte da minha lista de gastos para o próximo ano.
No balanço geral do ano, não me atrevo a reclamar do que foi até aqui vivenciar uma pandemia, porque não perdemos ninguém próximo, continuamos trabalhando, mantivemos a saúde, ainda temos comida, teto, água, bichos de estimação, chuveiro, internet, energia elétrica. Acho que só assim para percebermos o quanto temos, o quão privilegiados somos e como precisamos de menos em um país em que tantos não têm nada. Claro que foi um jeito de descobrirmos mais sobre nós mesmos. Enquanto os amigos descobriam a culinária como uma forma de relaxar, eu descobri que odeio mesmo o trabalho doméstico, o "ter de fazer" como se fosse o meu papel enquanto mulher. Essa ojeriza em relação aos papéis "femininos" não me impediu de experimentar uma receita nova de chocotone do Luís Américo Camargo, para mim a receita definitiva, depois de ter experimentado tantas ao longo do aprendizado padeiro. Se não tenho fotos do meu chocotone, é culpa da câmera instalada no celular remontado pós-carbonização.
Sobre ser mulher, tenho sabido cada vez mais, e a pandemia também foi responsável por mostrar as mulheres não só como vítimas do feminicídio crescente mas sobretudo como a maior força responsável por ações de solidariedade no país. Foram as mulheres que organizaram as ações comunitárias, a autogestão, a doação de alimentos in natura e de cestas básicas, a proteção às vítimas de violência doméstica. Vi amigas cozinhando para moradores de rua e angariando presentes e ceias natalinas para famílias carentes. Essa tendência feminina à doação, que não deve ser confundida com subserviência, teve destaque no meu TCC justamente como tática de luta, de guerrilha.
Não vou, portanto, reclamar do meu ano pandêmico, embora persista a dificuldade de planejar o futuro, essa suspensão do tempo. Cumpri minhas tarefas e metas, finalizei cursos, sobrevivi ao trabalho doméstico, conheci o piriforme, aprendi coisas novas, defini o que é importante e o que é intolerável para mim. Acho que posso considerar isso tudo um presente - talvez não o mais bonito, mas o mais útil no momento.
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segunda-feira, 21 de dezembro de 2020
Mais uma chance à banoffee
Fiz de novo a receita de banoffee pie da Dani Noce, ainda que sob protestos do marido, que não entendia por que eu não podia cobrir a torta com pecã no lugar de banana. Tudo era uma questão de sazonalidade, e também uma boa desculpa para comprar um bom doce de leite, né? Além disso, soube que a banoffee está super na moda e até recebi uma receita da minha querida Marisa.
Da primeira vez que fiz, há 3 anos, o recheio virou um tsunami na hora de cortar, o que é sempre uma decepção quando o assunto é torta. Desta vez, resolvi mexer um pouco nas proporções. Para o recheio (torta pequena), usei 200 g de doce de leite argentino, 100 g de creme de leite 30%, 2 gemas e 20 g de amido de milho. Para a massa, 180 g de biscoito maizena e 90 g de manteiga amolecida, batidos juntos no processador. Assei a massa por 20 minutos, deixei esfriar, pincelei no fundo 60 g de chocolate meio amargo derretido e levei para a geladeira uns 10 minutos. Espalhei o recheio de doce de leite e deixei na geladeira até o dia seguinte. Na hora do almoço, cobri com rodelas de banana, pincelei um pouco de suco de limão nas bananas, para não escurecerem, e deixei para aplicar o chantili da Vigor só na hora de servir - quando também salpiquei chocolate em pó 70% cacau com um toquezinho de pó de café.
Ficou muito boa, mas de fato é para formiguinhas. Uma sobremesa para fazer de vez em quando, se quisermos algo bem descolado e não convencional, um doce de encher os olhos. Vale a pena ter esse trunfo na manga.
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quinta-feira, 17 de dezembro de 2020
O parto da marmota
Ao fim de nove meses de pandemia, 2020 vai parindo a si mesmo em looping. Já se vê a cabecinha da marmota apontando. Quantas vezes ela vai nascer? Não temos a menor ideia, tudo depende de a vacina estar disponível. Espero que no próximo ano possamos pelo menos ecoar Belchior: "ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro".
Aliás, por falar em Belchior, entro em dezembro tendo acabado de assistir ao emocionante e necessário AmarElo, documentário sobre o álbum de mesmo nome do Emicida que, aliás, se inicia com esses versos do mais saudoso dos cearenses. Amar se aprende, ser solidário se aprende - hoje não consigo conceber como alguém ainda pode achar que os problemas enfrentados por negros, pobres, mulheres, gays não têm relação consigo. A indiferença é realmente um troço mortal, dizimadora de afeto e esperança.
Não sei o que teria sido de mim em 2020 sem os pets e o pilates on-line - talvez tivesse entrado numa depressão profunda. Mas ainda vou levar as inquietações todas para o próximo ano, porque não há mais como, diante da crua desigualdade social, racial, de gênero, não fazer nada.
Em 2020, comprei mais pela internet, uns 15% além do que compraria em um ano normal, mas nada tão diferente do que costumo comprar. Roupas que só vou usar em casa mesmo, coisas pra casa, remédios pra pets, delicadezas de papelaria, ferramentas para bordar, cursos. Vixe, que eu continuei consumista mesmo com o medo da crise (e talvez pela ansiedade provocada por ela), mesmo com toda revisão de mundo. Como já disse, ainda somos privilegiados com ter trabalho, teto, comida.
Fiquei sem pedalar, mas tentei treinar em casa, bem menos do que gostaria. Engordei, mas nem tanto. Esqueci de tomar sol, até porque aqui choveu o tempo todo. Tive micose, desconfio que estou no final de uma gastroenterite, ou foi o excesso de anti-inflamatório que provocou um revertério intestinal nas duas últimas semanas. E ainda lateja o local da extração do dente. Mas nada que se compare à crise do piriforme por 24 dias, e cheirando a água sanitária.
Nossa vida social se limitou ao supermercado e aos almoços com os sogros. Fui com um certo pânico ao dentista e fazer uma radiografia panorâmica. Visitamos um casal de amigos, e o tempo todo pensei, entre sorrisos, que podia/posso ter sido infectada. Fomos ao shopping para umas poucas compras de Natal sem qualquer sentimento de lazer, embora víssemos várias pessoas vivendo essa ilusão, mesmo mascaradas.
Vimos ainda mais séries que antes. Fiquei ainda mais cansada que antes. 2020 só veio confirmar o que não quero para minha vida. Sei que nada será como antes, amanhã.
Acompanhei a transformação do meu trabalho, que já era remoto, em uma versão EAD. Fiz curso para dar conta dessa mudança. Aliás, fiz um tanto de cursos - foi uma coisa boa nesse período. Tentei colocar a criatividade em prática, e não só na cozinha. Pintar, bordar, voltar a escrever - e aqui tive um choquezinho.
E vi o mundo entrando numa escuridão cuja extensão não dá ainda pra precisar. Por isso acho que me emocionei tanto assistindo ao documentário de Emicida, uma luz no breu, uma chama de resistência e união em meio ao horror, um brado por justiça, arte no seu estado de guerrilha. Na verdade, a única saída possível. Que nos inspire para continuarmos respirando.
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segunda-feira, 14 de dezembro de 2020
Vô. Vó.
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Finalizações num ano sem fim
Embora 2020 pareça nunca terminar - e a depender da pandemia e da demora da vacinação no Brasil, vai adentrar boa parte de 2021 -, algumas coisas chegam à sua conclusão, que bom!
Este mês, vi meu enteado querido apresentar brilhantemente seu TCC do curso de Direito, imagine! O menino que conheço desde os 13 anos, que foi ganhando barba e refinando a inteligência e o caráter, arrasou na defesa de um tema ousado de forma "aguerrida" (e me lembrei de ter ouvido esse mesmo elogio à minha escrita no mestrado), que orgulho!
Também chegou por fim meu volume do livro Vkhutemas, desenho de uma revolução, organizado pelo Celso Lima e pela Neide Jallageas e de cujo financiamento coletivo participei - era para termos recebido o livro em março, mas daí a pandemia, já sabemos. Foi outro motivo de orgulho, ter participado de forma indireta desse projeto tão importante e bonito.
Por fim, embora ainda precise entregar meu TCC, produzi um videozinho para o curso de jornalismo - aprendi na marra a colocar legendas e áudio no iMovie.
Conseguir concluir qualquer coisa este ano já é de grande valor, é pura guerrilha.
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- "O processo", de Franz Kafka
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- "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
- "Amphytrion", de Ignácio Padilla