quarta-feira, 24 de julho de 2019

Existirmos, a que será que se destina?

Não faz muito tempo eu soube da história por trás da música "Cajuína", de Caetano Veloso. Torquato Neto, poeta e parceiro musical de Caetano, havia se suicidado em 1972, aos 28 anos. Caetano, de passagem por Sergipe, foi visitar o pai do poeta. Desse encontro de pouquíssimas palavras, um presente de flor e um brinde de cajuína surgiu um dos mais belos poemas da MPB, junto com a pergunta angustiante-inevitável: "existirmos, a que será que se destina?"
Mais perto dos 50, depois do cumpleaños recente, sigo me perguntando, sem horizonte de respostas satisfatórias. Percebo o desgaste do corpo físico, a dificuldade em emagrecer, problemas de saúde dando as caras, as expectativas alheias com relação a meu trabalho, os meus esforços agora mais árduos em abrir caminho, a dança sem fim dos relacionamentos. Isso para não falar do contexto em que isso se dá, com governante louco, disparates de toda ordem, economia ruim, perda das conquistas sociais, um desânimo geral em seguir vivendo na republiqueta de bananas. Nada que se compare, claro, à exaustão de existir que tomou Torquato, embora o cansaço seja natural, até esperado.
Não sei se acredito que todos têm uma missão, mas todos desejam algo. Eu, como Claudinho e Buchecha, só quero ser feliz, apesar de tudo. No final, ouvir o coração, buscar o que faz alma cantar, isso deveria ser o destino de cada um. Nem todo mundo encontra, nem todo mundo busca, nem todo mundo que encontra se satisfaz, e por isso seguimos perguntando qual o sentido da existência. 
Existir plenamente deveria bastar, mas muitas vezes as condições circunstantes não colaboram. Na maioria dos casos, existência torna-se resistência e cada vez mais subsistência. Essa injustiça no direito de existir interfere na minha existência, e talvez venha daí a ideia de missão - o que fazer para que mais pessoas tenham assegurado esse direito de ser, de viver plenamente? A indiferença não me define. 
Mais perto dos 50, sigo ouvindo este cansado mas não derrotado coração. Fazendo caminho, contra o vento e a favor dele. Mesmo sem saber bem para quê, existindo da melhor maneira.

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Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

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