sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

Vencer o bode da salada com... salada!

Embora descendente de orientais, nunca fui muito da salada. Parte disso devo a ter sido criada por avós nordestinos, cuja cultura culinária na época era pouco afeita aos verdes, mais voltada para carnes e peixes e tubérculos. 
Outra parte tem a ver com minha pouca criatividade na combinação de verduras para compor uma salada, fortalecida por um pouco de preguiça de lavar tudo com hipoclorito de sódio. E cortar pepino, tomate, claro. Aliás, tomate, mal suporto hoje em dia. Mas todo dia tem. 
Tenho a impressão de que ultimamente as verduras cruas não me caem bem, o que, embora realmente aconteça com algumas pessoas, pode ser, no meu caso, só um nojo alimentar recente, que tem tomado a relação com minha comida quase de modo geral. Além do cansaço de cozinhar todo dia, o cansaço do próprio tempero. 
Mas preciso comer, e preciso comer bem, porque sei que a nutrição transforma minha relação com as alergias para bem e para mal. Ter voltado a comer leguminosas me fez muito bem, com o aporte de proteínas e de fibras para o dia a dia. Então lancei a pesquisa na internet sobre saladas diferentes do trivial, e recebi de volta dicas da maravilhosa Rita Lobo, a maior defensora da comida de verdade entre os famosos da gastronomia. Encontrei justamente um post sobre "10 saladas que valem por uma refeição", com ingredientes como milho, carne, pimentão, grão de bico e até bacalhau. 
Já testei algumas, e fiquei muito feliz com os resultados, especialmente quando deu para ganhar tempo com alguns ingredientes já prontos, como o milho em lata e o grão de bico de caixinha (porque o demolho, tão necessário, também me dá uma preguicinha). Continuo, graças a dona Rita, ainda mais fiel à comida de verdade (sobretudo após uma breve e recente experiência não tão agradável com produtos à base de xilitol) e meu paladar e meu sistema digestório (e acho que marido também) agradecem. 

Pintura do piso e classes sociais

Enquanto esperávamos a definição de parceiros profissionais, resolvemos enfim pintar o piso de casa (porque também não queria mais ouvir que minha casa é um cafofo). 
Pessoalmente, preferia colocar um piso novo, já que teríamos que tirar tudo do lugar de qualquer jeito, mas Guga insistiu na pintura - mais econômica, com certeza, mas com sabida menor durabilidade. Após mais de um ano de tratativas, fomos comprar tinta e acessórios. 
Tira tudo de um cômodo, coloca no meio de outro, limpa, pinta chão, espera secar, outra demão, coloca de volta. De repente, um risco no chão e desespero do marido, que, aprendi, é melhor não fomentar, preferindo o silêncio. Dormimos no meio da sala, sob ataque das muriçocas, calor infernal, Chica uivando do lado de fora até deixarmos que ela entrasse para dormir no caos com a gente. Por mais cinco dias, seguimos nessa faina, com o acréscimo da aplicação de uma resina acrílica, até o caos ir diminuindo, diminuindo a ponto de desaparecer. O resultado foi ótimo, mesmo sujeito aos arranhões das patas de Kong e mesmo evidenciando a urgência da pintura das paredes.
Em meio à empreitada, Guga comentou que pintar piso é uma solução das classes menos favorecidas para dar um tchans no ambiente. Eu nunca tinha pensado nisso, talvez porque venha justamente das classes menos favorecidas e sempre achei normal não somente a pintura toda de casa, mas também botar a mão na massa pra realizar as mudanças de todo tipo na vida. Justamente por isso, no final das contas, acho que o comentário dele faz muito sentido. 
Daí - depois que "peguei a ideia", da relação entre "remediar" e remediados - fiquei pensando nas realidades paralelas deste país e do mundo cindido em classes. Outro dia mesmo, num almoço, eu comentava a aventura que foi ir para o Reino Unido na maior dureza, já que havia surgido o tema de câmbio e viagem internacional. Esse assunto, que já rendeu tantas trocas de experiências e risadas com amigos, ali provocou um misto de complacência e estranheza, como se aquelas pessoas não fossem sequer capazes de imaginar uma situação assim. O único gringo do grupo e o único rapaz negro foram as únicas pessoas que demonstraram entender de que se tratava. Comentei com o marido, e ele teve a mesma impressão: "Claramente, outra classe social". Realmente, pensando em retrospecto, não consigo imaginar aquelas pessoas raspando a cera do piso com uma espátula, carregando móveis para lá e para cá, suando em bicas nem mesmo na execução de tarefas mais básicas, como cozinhar e lavar louça. Lembrei-me de um encontro com Guilherme Afif Domingos na TV Cultura, em que ele descobria o sentido da palavra "mistura" quando apresentávamos a ele um material educativo para trabalhadores.
Para além de pensar que essas pessoas não estão nem aí para os mais desfavorecidos que nós, prefiro me lembrar que sempre estive cercada de gente que se importa - este sim, o verdadeiro privilégio.

domingo, 2 de janeiro de 2022

Um pouco de sal grosso, por favor

E então a Covid bateu por aqui, no final do segundo tempo. Quase dois anos de proteção, com máscaras, álcool em gel, evitando aglomeração e saídas desnecessárias, ansiando pela vacina e tendo, finalmente, conseguido tomar as 3 doses. Provavelmente, veio com o enteado no voo em que ninguém foi cobrado dos comprovantes de vacinação e menos ainda da testagem PCR.
Três dias depois da chegada, Guga perdeu o olfato. Tinha tido gripe, com um pouco de febre, antes da chegada de Guiga. No mesmo dia em que o pai deixou de sentir cheiros, Guiga teve um pouco de febre e dor leve nas articulações. Depois do choque da revelação e de meu sogro ir buscar informações no posto de saúde, lá foram os dois fazer teste rápido na UBS. Por sorte, o resultado  saiu em 15 minutos. Positivo para os dois. E daí partiu a segunda caravana para testagem: eu, sogros, avó de marido, cuidadora da avó. Negativamos. Me mudei pra casa da sogra, deixei pai e filho em conversas mais profundas, não exatamente fáceis. 
Eu já tinha queimado a perna no escapamento da moto na outra semana, peregrinei em busca de um curativo para queimadura de segundo grau, cheguei a ir ao posto lotado para que um médico desse uma olhada no ferimento, mas saí por insistência do marido, que achou que eu podia pegar Covid. Voltei pra casa sacolejando na moto, com muita dor na perna e com o incômodo que só uma mulher conhece de um absorvente íntimo mal colocado, benzadeus. No outro dia, arrematei todos os curativos hidratantes que encontrei numa loja de produtos  hospitalares. 
Antes do diagnóstico de Covid, o marido sentiu uma coroa do dente soltar enquanto almoçávamos. E inventou de perguntar: o que mais falta acontecer?
Aconteceu a Covid. Imagino como seria sem a vacina. Só me ocorre agradecer ao SUS, que ainda por cima nos proporcionou testagem rápida de alta  tecnologia e um ótimo atendimento. Isso já vale para que 2021 não  tenha sido completamente perdido. 

Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

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