Quando soube que havia uma peça baseada no primeiro livro que li de bell hooks, Ensinando a transgredir, fiquei toda animada. Logo fui comprar ingresso - achei um pouco caro, mas tudo bem, valeria a pena. Ainda por cima, era relativamente perto, no teatro da Aliança Francesa.
Lá fui eu numa sexta-feira para a ladeira da Barra. Talvez a perimenopausa me deixe hipersensível ao ruído, então a algazarra ao redor - o público parecia formado por familiares entusiasmados dos atores - me irritou um pouco. Quando entramos na sala, achei tudo desconfortável, precisando de uma reforma urgente (ainda mais depois de ter estado no Cineteatro 2 de julho, lindo, com atrações gratuitas para jovens estudantes de escolas públicas). Havia um rapaz, trepado num nicho, tocando os mesmos dois acordes de guitarra interminavelmente.
A peça já começa com os jovens atores entrando correndo, contando que invadiram uma sala, bateram nos professores, deram um tiro. Fiquei espantada: o que isso tinha a ver com o livro de bell hooks, que fala da educação como ferramenta de transformação social e da transgressão no sentido de propor visões mais amplas da realidade? Na verdade, a participação de bell hooks se limitava a três leituras de trechos do livro, por uma atriz que fazia as vezes da autora. Como descobri mais tarde, a peça é, na verdade, a encenação ipsis literis (com exceção dessas cortinas com texto de bell hooks) de uma peça, Coro dos maus alunos, de um autor português, Tiago Rodrigues. A peça de Rodrigues é anterior à série Merlí, da Netflix, mas tem a mesma premissa: um professor de filosofia transforma a vida de seus alunos, levando-os a questionar as formas tradicionais de pensamento. No caso da peça, isso leva à idolatria do professor e à violência extrema dos alunos ao defenderem o mestre de uma demissão injustiça.
É difícil eu não gostar de uma peça de teatro. Mesmo abstraindo o amadorismo do grupo, fiquei o tempo todo pensando em como aquela peça poderia levar as pessoas que não conhecem a obra de bell hooks, quase uma pupila de Paulo Freire, a concluírem que o que ela defende é um quebra-quebra quando discordamos de alguém. Nada mais distante dos aprendizados deixados pela autora de Tudo sobre o amor.
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