Assisti outro dia a um filme indicado por Dani, Mon roi, da diretora francesa Maïwenn. Poderia dizer que é um filme de terror - Georgio, personagem de Vincent Cassel, é um restaurateur charmoso e abusivo que se relaciona com a advogada Tony, vivida por Emmanuelle Bercot. Ele decide tudo no relacionamento: ter um filho, o nome da criança, deixar a namorada/mulher no apartamento enquanto vai morar em outro onde recebe a ex. Georgio é claramente tóxico, mas sedutor, se faz de vítima, um puer aeternus típico, e Tony não consegue se desvencilhar, e até o fim ficamos presas ao filme, sem fôlego, à espera de que ela consiga ir embora. Terrível! Há quem diga que Maïwenn se inspirou na sua história com Luc Besson.
Isso me fez pensar em outros filmes sobre términos difíceis de casamento após relacionamentos tóxicos. História de um casamento, de Noah Baumbach, traz o casal Nicole e Charlie, vividos pelos charmosos Scarlett Johansson e Adam Driver, vivendo o fim do casamento de forma progressivamente dolorosa. Nicole também abre mão de seus interesses em prol da relação - ela, uma atriz em ascensão, deixa tudo para cuidar da família com o marido diretor, que não abandona nem um milímetro de sua carreira. A advogada Nora, interpretada pela ótima Laura Dern, ajuda Nicole a enxergar a realidade.
A esposa, filme de Björn Runge, traz Glenn Close no papel de Joan, mulher de Joe, premiado escritor que acabou de ser premiado com o Nobel de Literatura. É exatamente a ocasião em que Joan revê seu casamento, sua dedicação irrestrita que a levou a suplantar seu próprio talento e tornar o marido um escritor reconhecido. E decide abandonar o marido, no meio da cerimônia de premiação. Descobrimos, então, que era ela quem escrevia os livros de Joe, que também tem um ego gigante, como os companheiros das outras películas.
Acabei hoje revendo A lula e a baleia, também de Noah Baumbach. Impressionante como esse filme de 2005, vinte anos portanto, é totalmente atual. Não há nada nele que possamos chamar de "datado", o que, no fundo, é triste: o machismo, a cultura patriarcal, o marido que manipula, que coloca para baixo para não se sentir inferior e que não suporta a ascensão da mulher - de novo, um casal de escritores. A personagem de Jeff Bridges, o marido, ainda procura alienar os filhos - o mais velho, que busca aprovação paterna, cede, mas o pequeno saca melhor a dinâmica familiar. Walt, o mais velho, tem o pai como exemplo e, ao ser desmascarado por usar uma música do Pink Floyd como sua, diz que sentia que poderia ter escrito a música - algo que seu pai provavelmente diria, no alto de sua arrogância. As mulheres são rotuladas por Walt e seu pai, homens que não amam mulheres. Mas Walt pode ter sua redenção, depois de se lembrar de ocasiões em que teve momentos especiais com a mãe e o pai nunca estava presente. E a mãe, Joan (outra Joan), vivida por Laura Linney, também já deu seu passo rumo a uma vida autônoma.
A questão nesses filmes não é o dano do casamento em si. Todos eles tratam, na verdade, de homens narcisistas, que colocam as parceiras como apêndices, apoios de seu sucesso, e só. São incapazes de partilha, de se alegrar com as conquistas alheias. Cada vez mais temos visto a realidade de exaustão feminina nas telas - mas, diferentemente de Kramer vs Kramer, em que a mulher é retratada como a vilã que abandona o filho e o pai que, afinal, tem que fazer o básico e é visto como herói.
Mesmo com tanto ultraconservadorismo hoje, seguimos dando um passo a cada dia, sem interromper a caminhada. Não importa quando, sempre é tempo de fazer o melhor.
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