domingo, 9 de agosto de 2020

Papardelle de espinafre com ragu "autêntico"

Ontem fiz massa fresca de espinafre com ragu de linguiça. Ficou uma delícia, sem modéstia. O talharim ficou mais pra papardelle, que eu adoro. Usei o varalzinho que comprei há um tempão. 
Outro dia, quando fiz ragu de shitake, um conhecido no Facebook, amigo de uma amiga, disse que aquilo não era ragu, que eu mudasse o nome. Além da ousadia de alguém vir me dizer o que eu devo fazer com a minha comida, fiquei pensando em como as pessoas dão importância a bobagens como o nome consagrado das comidas. Eu mesma já pensei brevemente assim: ah, como uma feijoada sem carnes pode ser chamada de feijoada? Não pode. 
Agora já acho que tudo pode. Aqui em casa cozinho muitas vezes com o que tem na geladeira, muitas vezes faltando algo da receita. Adapto milhares de vezes. Acho que nem poderia ter um restaurante, porque cada vez faço o prato de um jeito, com mais ou menos curry, com páprica, com umas raspas de limão, com mandioquinha ou batata-doce, com ricota no lugar do creme de leite, com agrião ou couve no lugar do manjericão para o pesto. Com os pães sigo um padrão bem mais regular, mas com a comida não, porque tem muita sazonalidade também. E fico toda pimpona quando não desperdiço os ingredientes. 
Aos defensores das tradições estanques, só tenho a lamentar. Aos preciosistas, sugiro que levem em conta, ao nomear pratos, as técnicas de preparo ou ingredientes principais ou origem do nome. Feijoada tem principalmente feijão, ragu vem do francês ragôuter, avivar o gosto, o que pode ser qualquer coisa cozida por muito tempo para extrair sabor. Não vou, claro, chamar de Boeuf Bourguignon ou Filé Wellington um prato sem carne, porque o nome já diz qual o ingrediente principal. Mas de resto acho que a galera devia relaxar, pensar nas questões mais importantes no mundo de hoje e curtir uma comidinha bem-feita e pronto. 

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Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

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