O filme é de 2009, e, só pra variar, eu ainda não tinha visto. E, como acontece várias vezes nas minhas descobertas tardias, fiquei encantada: Julie e Julia, de Nora Ephron (a mesma do fofo Mensagem para você), é de aquecer o coração - e o estômago.
OK, nenhuma novidade: ao lado dos documentários, filmes sobre Segunda Guerra, franquismo, serial killers, de suspense, adoro filmes fofos e com temáticas gastronômicas. Neste último caso, integram minha lista best of o memorável A festa de Babette, a divertida animação Ratatouille, Chocolat e o ótimo exemplar de humor negro Estômago. E quem não embarcou em Tomates verdes fritos ou foi completamente seduzido em Como água para chocolate? Por extensão, que delícia são os filmes que falam de vinhos (e de uma boa comida que os acompanha, sempre), como Sideways, Um bom ano e Bottle shock. E outros tantos títulos que ainda não vi, mas que certamente já entraram para a bibliografia enogastronômica.
Mas voltemos a Julie e Julia. Não sei se já comentei, mas demorei muito a aprender a cozinhar. Não precisava, pois minha avó o fazia para nós, e a partir do colégio mal parava em casa, comendo muita junk food por aí. Quando, portanto, fui morar sozinha, as únicas coisas que sabia fazer eram café e ovo frito (ou mexido, ou cozido, variações do tema). Claro que isso me distancia das duas protagonistas do filme, pois tinham já uma noção culinária antes de incrementar seu saber; mas o gosto pela culinária, como gourmand, eu sempre tive - e isso já nos torna um trio inseparável!
Como Julia Child, fui fazer um curso de culinária. Não um cordon bleu, obviamente, mas um gratuito para iniciantes, na antiga Casa Gourmet da Bela Cintra. Chamava-se "Gastronomia para quem mora sozinho". E do arroz e macarrão básicos desse primeiro curso, passei para os pães (o primeiro que fiz me emocionou até as lágrimas), crepes, culinária árabe, ceia de Natal e sushi & sashimi. Minha mãe sacou meu interesse (e minhas necessidades de moradora solo) e me deu o ancestral Dona Benta que tinha em casa desde que éramos pequerruchos.
Fui comprando algumas revistas, um ou outro livro de receitas, mas minha maior fonte são mesmo os blogs e sites dos amantes da culinária, que sempre cito aqui, como origem das receitas que vou transformando, com outras dosagens e ingredientes. Aliás, num desses, o Mixirica, achei traduzida a receita do boeuf bourguignon (vedete do filme) que ainda não fiz. Os utensílios - como a tal panela que também deve ir ao forno -, vou adquirindo conforme a receita e a necessidade.
Quanto a Julie Powell, como me identifiquei com ela! Bom, eu e a torcida com veleidades gastronômicas do Corinthians, certo? De qualquer forma, além de ela ter um blog, como compreendo quando ela diz que cozinhar é um momento em que sabemos que as coisas (normalmente) darão certo, mesmo que tudo lá fora (trabalho, relacionamento, caos urbano) ateste o contrário. Num certo sentido, é quando acreditamos no poder do nosso condão enquanto ninguém mais acredita - e o risoto com sabores que nos transportam a outro lugar (um refúgio do que está errado aqui e agora) é a prova indelével desse poder. Onde nosso instinto falha nas relações humanas, ele funciona lindamente na hora de misturar ervas e temperos, de achar a justa medida.
Olhando para o espelho e para Julie e Julia, confirmo que a escolha é nossa: o insosso de uma vida em que um dia dá lugar ao outro, como uma sequência de bandejas no restaurante universitário, ou o maravilhar-se constantemente com novos cheiros e sabores, criados por nós.
Ah, sim: como J&J, também tenho um provador oficial de receitas... <3
sexta-feira, 20 de janeiro de 2012
terça-feira, 17 de janeiro de 2012
Gourmandise X - Festive Strudel ou domando a massa fillo
Gente, eu consegui!
Fiz o strudel que o Jamie Oliver apresentou em seu programa de Natal, com recheio de panetone, pera, maçã e um fio de chocolate meio amargo. Hummm, fica muito bom, e não é enjoativo como se pode supor à primeira menção (vejam a receita em http://www.jamieoliver.com/recipes/fruit-recipes/festive-strudel).
O mais difícil para esta cozinheira sazonal foi tentar separar as folhas de massa fillo da Arosa. Isso mesmo, só tentei; deve haver uma temperatura certa pra fazer isso, após o descongelamento. Mesmo seguindo as instruções, dei início à destruição das folhas assim que comecei a separá-las. Por que elas não vêm separadas por plástico filme? Meu Deus, por quê? :0
Então, meu lado ariano falou mais alto, resolvi ir pro abraço, coloquei as folhas de duas em duas mesmo, e deu tudo certo. Atestem pela fotinho (do meu strudel, não do do Jamie, of course).
Fiz o strudel que o Jamie Oliver apresentou em seu programa de Natal, com recheio de panetone, pera, maçã e um fio de chocolate meio amargo. Hummm, fica muito bom, e não é enjoativo como se pode supor à primeira menção (vejam a receita em http://www.jamieoliver.com/recipes/fruit-recipes/festive-strudel).
Então, meu lado ariano falou mais alto, resolvi ir pro abraço, coloquei as folhas de duas em duas mesmo, e deu tudo certo. Atestem pela fotinho (do meu strudel, não do do Jamie, of course).
segunda-feira, 19 de dezembro de 2011
Yo tengo tantos hermanos...
...pero los puedo contar!
Dos oito, porém, adianto que as meninas estão sempre mais disponíveis (qual a novidade, se são mulheres?) para os encontros familiares. Sorte delas - e do meu cunhado e de Guga -, que provaram um bom peru recheado, o clássico arroz com amêndoas, caponata e maionese (estas eram receitas da sogra, aprovadíssimas por todos). Ainda deu tempo de fazer um creme de cupuaçu para driblar o calor.
Como é bom compartilhar histórias com quem tem tanto em comum com a gente! Alegrias, algumas dores a cicatrizar, muitos sonhos e carinhas parecidas - as fotos não me deixam mentir. E já me enchem de saudade.
Liloca, Sayurica, Yumica, Mariezica e yo.
terça-feira, 6 de dezembro de 2011
Comentário expresso IV
Uma nova modalidade de aconselhador: urubu de pirata! Luxo (ou lixo?)!
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quarta-feira, 9 de novembro de 2011
Meninos, eu vi - "A pele que habito"
Embora este post seja para falar do filme, contraditoriamente não posso falar muito do filme em si, ou estragarei toda a surpresa. Só tenho a pedir: por favor, vão ver a nova produção de Almodóvar!
Certamente haverá quem não goste, que ache furos de produção (mas mais raramente de roteiro); todos que o assistirem, porém, terão oportunidade de ver como Pedrito é capaz de se reinventar. Tomando de empréstimo o título, de "trocar de pele" com a maior facilidade. E isso sem perder sua essência algo kitsch, ingênua e apaixonada. Com simulacros a descoberto, referências diversas e, mesmo assim, identidade própria.
No exemplo da relação do cineasta com sua obra, enxergo essa lição: como manter a integridade adaptando-nos a novas situações. Ser flexível, e não venal. Mudar, sendo nós mesmos. Encontrar, em cada momento da vida, a pele que nos cabe.
Certamente haverá quem não goste, que ache furos de produção (mas mais raramente de roteiro); todos que o assistirem, porém, terão oportunidade de ver como Pedrito é capaz de se reinventar. Tomando de empréstimo o título, de "trocar de pele" com a maior facilidade. E isso sem perder sua essência algo kitsch, ingênua e apaixonada. Com simulacros a descoberto, referências diversas e, mesmo assim, identidade própria.
No exemplo da relação do cineasta com sua obra, enxergo essa lição: como manter a integridade adaptando-nos a novas situações. Ser flexível, e não venal. Mudar, sendo nós mesmos. Encontrar, em cada momento da vida, a pele que nos cabe.
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quinta-feira, 13 de outubro de 2011
domingo, 9 de outubro de 2011
"Um conto chinês" e Ricardo Darín
Na última semana, fomos assistir a uma comédia argentina (estamos muito "arxentinos" ultimamente), Um conto chinês, do diretor portenho Sebastián Borensztein. Com ninguém menos que Ricardo Darín, claro.
O cinema vem abaixo logo na primeira cena do filme, quando uma vaca cai do céu sobre um bucólico barquinho num lago chinês, interrompendo absurdamente um pedido de casamento. Mais não posso dizer, para que ninguém deixe de assistir a uma das melhores comédias dos últimos tempos. Comédia no sentido do que faz rir (e, como bem assinalou Guga, todo mundo pareceu sair mais leve do cinema) e também no de farsa reveladora. Quanta coisa nos diz o chinês que não ganha uma legenda sequer na película! Quanta coisa a personagem de Darín diz que gostaríamos de dizer!
Feita a sugestão, queria mesmo comentar, sem nenhuma novidade, como Ricardo Darín é um ator incrível. Não precisa fazer caras e bocas para ser convincente em qualquer papel. Porque seu principal papel é o do homem comum, pateticamente humano, pouco heroico, cheio de defeitos, medos e paixões e algumas coragens súbitas - por isso mesmo tão emocionante. Como nós, ordinary people. Quem não se reconhece no rabugento ex-combatente das Malvinas, que tem medo/culpa de ser feliz? Ou no dono de restaurante cuja maior preocupação parece ser o mascarpone que falta ao tiramisù, e que precisa confrontar o Alzheimer da mãe? Ou, ainda, no advogado que sofre calado por amor, mas que tem coragem para fazer justiça e honrar o amor alheio covardemente destruído?
Acabo de falar em "pouco heroico", mas entendam isso como "pouco poderoso". Porque, no fundo, Darín só faz ressaltar em suas personagens o que há de mais heroico no ser humano: a centelha divina que nos lança na difícil aventura de existir (coragem, esperança, teimosia? chamem como quiserem), diariamente. Não é assim? Mesmo quando parece não haver sentido para prosseguir, prosseguimos.
O cinema vem abaixo logo na primeira cena do filme, quando uma vaca cai do céu sobre um bucólico barquinho num lago chinês, interrompendo absurdamente um pedido de casamento. Mais não posso dizer, para que ninguém deixe de assistir a uma das melhores comédias dos últimos tempos. Comédia no sentido do que faz rir (e, como bem assinalou Guga, todo mundo pareceu sair mais leve do cinema) e também no de farsa reveladora. Quanta coisa nos diz o chinês que não ganha uma legenda sequer na película! Quanta coisa a personagem de Darín diz que gostaríamos de dizer!
Feita a sugestão, queria mesmo comentar, sem nenhuma novidade, como Ricardo Darín é um ator incrível. Não precisa fazer caras e bocas para ser convincente em qualquer papel. Porque seu principal papel é o do homem comum, pateticamente humano, pouco heroico, cheio de defeitos, medos e paixões e algumas coragens súbitas - por isso mesmo tão emocionante. Como nós, ordinary people. Quem não se reconhece no rabugento ex-combatente das Malvinas, que tem medo/culpa de ser feliz? Ou no dono de restaurante cuja maior preocupação parece ser o mascarpone que falta ao tiramisù, e que precisa confrontar o Alzheimer da mãe? Ou, ainda, no advogado que sofre calado por amor, mas que tem coragem para fazer justiça e honrar o amor alheio covardemente destruído?
Acabo de falar em "pouco heroico", mas entendam isso como "pouco poderoso". Porque, no fundo, Darín só faz ressaltar em suas personagens o que há de mais heroico no ser humano: a centelha divina que nos lança na difícil aventura de existir (coragem, esperança, teimosia? chamem como quiserem), diariamente. Não é assim? Mesmo quando parece não haver sentido para prosseguir, prosseguimos.
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Tudo de bão
Cabeceira
- "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
- "Geografia da fome", de Josué de Castro
- "A metamorfose", de Franz Kafka
- "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
- "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
- "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
- "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
- "O estrangeiro", de Albert Camus
- "Campo geral", de João Guimarães Rosa
- "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
- "Sagarana", de João Guimarães Rosa
- "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
- "A outra volta do parafuso", de Henry James
- "O processo", de Franz Kafka
- "Esperando Godot", de Samuel Beckett
- "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
- "Amphytrion", de Ignácio Padilla