quarta-feira, 11 de março de 2020

O primeiro pão de queijo, com receita de dona Jacira

O pão de queijo feito por minha mãe é pura comfort food, já disse aqui. O de minha sogra se lhe equipara em termos de sabor, embora não tenha o apelo da memória. Volta e meia saboreamos os pães perfeitamente redondos que ela sempre tem congelados para qualquer eventualidade. 
Justamente porque eles congelam tão bem é que resolvi pegar a receita dela e fazer um bocado para nós. Comprei queijo minas padrão, polvilho azedo, juntei maizena, ovos, óleo, manteiga e sal e logo tinha uma massa pegajosa, difícil de manipular. Até sovei na batedeira, mas mesmo assim era impossível fazer as bolinhas. Deixei na geladeira por uns minutos, enquanto aquecia o forno. Então fiz as bolinhas, não tão perfeitas, e coloquei boa parte no congelador, e algumas no forno, para experimentarmos imediatamente. 
Ficou maravilhoso! O único lembrete é que, uma vez congelado, o pão de queijo precisa ir ao forno preaquecido em forma untada - ou perde os fundos! 

Aipim rosti

Sobrou aipim cozido na geladeira. Tenho comprado aipim congelado, porque assim não tem erro (sou péssima pra escolher; metade das vezes dá errado). Só que este cozinhou um pouco demais, virou tipo purê, então tinha deixado num potinho à espera de uma oportunidade.
Ontem me ocorreu fazer com o purezinho um aipim rosti, como a batata suíça. Com certeza alguém já teria feito - e depois que tinha realizado a experiência descobri que Rodrigo Hilbert e Troisgros fizeram as suas. Rá!
Ficou muito gostoso! Coloquei na minifrigideira uma colher de sobremesa de banha de porco (pois é, comprei um pacote de 1 kg pra experimentar), deitei nela a massa de aipim, polvilhei queijo ralado na hora e deixei um tempo "firmando" a massa. Quando estava próximo disso, fui colocando bocadinhos de manteiga nas bordas, levantando-as como se fosse omelete. Com a massa quase firme, virei para tostar do outro lado. Uma ótima variação do aipim nosso de dia sim, dia não. 

domingo, 8 de março de 2020

Jantar de sábado com comfort food inesperada

Arrumando os potes de temperos e trocando as etiquetas por Contact outro dia, me deparei com o espinafre em pó que comprei e não usei. Como não temos comido muita massa, nem mesmo fresca, ele foi ficando meio pra escanteio. Mas fiquei a fim de experimentar uma lasanha verde com frango ao molho branco - uma mistura das lasanhas de caixinha da Sadia, que tem lasanha verde à bolonhesa e lasanha de frango ao molho branco. Ficou ótima, embora na foto acima nem dê pra ver que a massa é verde.
Para acompanhar, fiz a musse de chocolate com claras e água que a Rita Lobo ensina no Cozinha Prática. Mas acrescentei raspas de laranja, dica de uma receita do Strava (!), que Guga me mandou. Meu, ficou com gosto de bombom da Garoto (Guga também lembrou) das antigas, cujo nome não sei! Uma inesperada comfort food no nosso jantar do final da semana. Grata surpresa, até pra quem cozinha. 

Dia das Mulheres Todas Juntas

Mais um 8 de Março. Menos mensagens melosas, menos imagens de flores na internet - bom. Muito mais desejos de luta e cooperação. Mas sempre tem ómi indagando "aim, mas por que as mulheres não querem mais flores?" e afirmando que "o feminismo de hoje colocou as mulheres contra os homens", que "o certo seria". Sério, não tenho mais paciência pra esse papo. Daí, desenhei. Quem sabe assim fica mais claro, né?
Flores deixam tudo mais bonito, mas não resolvem os problemas de desrespeito e desigualdade de direitos. Enquanto isso - a resolução dos problemas - não acontece, seguimos de mãos dadas. E depois também.

sexta-feira, 6 de março de 2020

Sangria e o poder da comfort food

Embora já tivesse tido contato com o conceito de comfort food, foi na pós da PUC-RS, com a aula da Dani Noce, que conheci o real sentido dado ao termo: o de comida da infância, ou comida de memória. Eu associava a comfort food ao prazer trazido pelo sabor de pratos despretensiosos, ou populares, ou caseiros. Algo como comer chocolate e sentir o estresse indo embora. Mas não necessariamente com essa comida - qualquer uma - que nos remete ao passado de forma prazerosa. 
A minha lista de comfort food não é sofisticada, porque minha mãe fazia poucos pratos; minha avó fazia o trivial e alguns pratos típicos em ocasiões festivas. Havia uma tia de Mauá que cozinhava maravilhosamente, e meus bolos de aniversário normalmente eram feitos por ela, mas não consigo falar de algo específico que ela tenha feito que me traga essa leveza nostálgica ao presente. 
Já o pão de queijo fofo e o bolo formigueiro de minha mãe, sim. Sagu de vinho, suco de caju, feijão com arroz que me lembram minha avó, sim. Ovo "baiano", mingau de maizena, chá mate com leite apresentados por meu avô, sim. Em alguma festa, aparecia sangria - e ontem fiz, e ficou com o mesmo gosto de antigamente. Minha madrinha trazia gelatina colorida com creme de leite. Coisas muito simples.
Como comer para mim é um prazer, fui conhecendo culinárias diversas e elegendo algumas comidas favoritas que me alegram muito o paladar e a alma. Mas é muito diferente do efeito da memória afetada por cheiros e gostos, simples que sejam. 
O cheiro e o sabor do suco de caju me levam diretamente à praça do externato onde minha avó me buscava; eu a esperava para tomar meu lanche, somente na saída do prezinho - muitas vezes, tinha suco de caju, que minha avó preparava, na lancheira. Minha sensação ao tomá-lo hoje é de uma paz de quem ainda estava segura com relação aos seus dias, que todos teriam aquela companhia, que decepção era uma ideia que nem sequer existia. 
Ah, milagrosos suco de caju, chá, sangria.

terça-feira, 3 de março de 2020

Caça às bruxas, João e Maria e nazismo no mesmo balaio

Quando fazia terapia, era muito mais fácil estar atenta à sincronicidade, esse conceito junguiano para "explicar" acontecimentos que não têm relação causal, mas sim de significado. Tipo andar pela Avenida Paulista e quase ser atropelada por uma borboleta e depois topar com alguém usando uma camiseta com o nome do país que eu visitaria em seguida para na sequência ouvir alguém falando desse país. Ou estar vivendo um dia péssimo e estar dentro de um táxi e avistar uma menina atravessando a rua, e ela olhar para mim e fazer um sinal de positivo. Muitas vezes, as sincronicidades têm a cara de milagres cotidianos, envolvem pessoas que nunca mais veremos na vida.
Na última semana, porém, ela rolou de forma um pouco diferente. Estava terminando de ler o livro de Silvia Federici, Calibã e a bruxa, que trata da caça às bruxas e sua relação com o novo "papel" dado à mulher no capitalismo nascente. Tivemos de ir a Salvador para resolver umas coisas, e para fazer hora fomos ao cinema - infelizmente, só havia filmes dublados, e acabamos vendo, diante das opções infantis, um remake de João e Maria. Um pouco mais terrível, com Maria tomando o lugar da bruxa e os irmãos lançando-a no fogo sem piedade.
Nada disso tinha me chamado a atenção (até porque dormimos durante metade do filme) até assistirmos, na mesma noite, a um episódio da série Hunters, da Amazon, com Al Pacino. Trata-se de um grupo de caçadores de nazistas nos anos 1970 que acaba cruzando o caminho de uma investigadora do FBI - negra e lésbica. 
Na verdade, foi um único comentário que a personagem fez que acabou ligando todos os pontos na urdidura. Ela perguntou à namorada se conhecia a história de João e Maria (!); disse que eram duas crianças alemãs, louras de olhos azuis, que encontram uma velha senhora que mora sozinha na floresta e que era, supostamente, uma bruxa. As crianças comem tudo o que a mulher lhes oferece para depois roubar-lhe a fortuna, a casa e a vida. A investigadora da série associa a ação das crianças ao ódio aos judeus - e Federici justamente mostra em seu livro como judeus, mulheres e hereges são colocados no mesmo caldeirão, associados à bruxaria por sua não adequação ao novo status quo. Embora João e Maria sejam personagens consagradas pelos irmãos Grimm no século XIX,  a depreciação de mulheres (especialmente se independentes e consideradas inférteis) e judeus já acontecia desde o século XVI, e na Alemanha, ainda não unificada, isso só ganharia mais força, culminando no antisemitismo nazista do século XX. 
Parece que tudo isso aconteceu para que essas relações entre machismo, racismo, intolerância e sociedade de consumo só ficassem ainda mais claras para mim, mostrando a extensão dessa rede de fatos históricos que tece uma imagem tão sombria da humanidade. Triste, mas claríssima. 

domingo, 1 de março de 2020

Romeu e Julieta e Contact: o passado revisitado

Outro dia, me deu uma vontade enorme de comer sagu, uma verdadeira comfort food da infância. Ainda não fiz, mas já separei uma receitinha para o próximo final de semana. 
Em compensação, neste final de semana voltaram dois outros clássicos do passado: Romeu e Julieta (queijo e goiabada) e papel Contact. 
Eu amo sobremesas com caramelo e baunilha, mas queijo e goiabada têm seu lugar em meu coração saudosista. Topei, em algum site, com uma receita de sorvete Romeu e Julieta, utilizando cream cheese, mas o que eu tinha em casa era iogurte grego que tinha ficado um pouquinho mais salgado/azedo que o normal (deixei dois dias na geladeira coando), e que logo associei ao gosto do queijo - então peguei um pouco de goiabada com a sogra e improvisei um sorvete. Ficou ótimo - imagino que com cream cheese fique perfeito.
Já o Contact tinha um quê de desafio na infância: como passar o adesivo sem deixar bolhas? Acho que desenvolvi bem essa habilidade, e voltei a usá-la hoje, colando nos potes de tempero etiquetas pretas escritas com tinta branca (de caneta Sakura, outra referência de infância/adolescência). As etiquetinhas com letra cursiva lembram quadro-negro e giz. Claro que aproveitei para dar aquela geral nos temperos, limpar todos os potes etc. 
A mistura de criação e organização ajuda a tornar um final de semana perfeito dentro das atuais possibilidades. 

Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

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