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quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

Uma viagem e sua bagagem de memórias

Pela primeira vez desde que saí de São Paulo não voltei lá como sacoleira. As passagens de avião já caras ficaram extorsivas com o preço pago pela bagagem, e não compensa nada despachar compras. Ficou mais vantajoso comprar no site das lojas da zona cerealista e pedir para entregar aqui. 
Desta vez, num bate-volta, fui só pra ver minha mãe, que andava meio borocoxô. Fiquei muito feliz de encontrá-la animada com o início das aulas de ioga no sindicato, onde encontra gente "da sua época", com muitas histórias em comum. 
Ela tinha preparado um álbum com fotos minhas em vários momentos da vida. Também me mostrou um álbum em que apareço bebê com meus irmãos - desse álbum, tirei fotos das fotos com celular, pois não teria coragem de privar minha mãe dessas imagens tão longínquas.  
Teve mais memória na nossa ida à feira de domingo, na rua da adolescência cheia de lojinhas criadas nas garagens dos prédios, no encontro com antigos vizinhos. Mas também teve memória nova na comida que fiz para ela, no pão de queijo gigante, no Red Velvet com recheio cuatro leches, nas lojas japonesas, no arigato gozaimasu que o vendedor dirigiu a ela sem obter resposta (muito paraguaia mesmo essa japa).  
Depois, já sem a companhia de mainha, mais memória no cannole de limão siciliano, nas manifestações pela cidade que não dorme, no sorvete do Bahia em plena Paulista, na mensagem de Cecília Meirelles em um café. O encontro com amigas e com uma nova vida, o lindo Antonio. 
Sem peso a carregar, só memórias, novas e renovadas. Uma bela bagagem. 
 

sábado, 16 de dezembro de 2017

Comida de raiz - feijãozinho tropeiro

Quando comecei a cozinhar, um dos primeiros pratos que fiz (a primeira coisa foi pão, claro) foi feijão tropeiro, seguindo a receita de um suplemento de culinária brasileira. Ficou bom, mas não tão bom quanto o que já comi em minhas andanças pelo interior de Minas e de São Paulo, berço desse prato restaurador de energias daqueles que levavam as tropas de mula pelo país.
Depois ainda fiz umas duas vezes, mas nunca com resultados satisfatórios para mim. Hoje, porém, aproveitei o feijão fradinho que estava pronto na geladeira, juntei linguiça, bacon, farinha, couve e salsinha, e pronto, tinha um feijão tropeiro gostoso, sem aquela característica mais gosmenta do feijão carioca que sempre verificava no prato. O salto na qualidade foi, com certeza, dado pelo feijão fradinho, mais sequinho sem deixar de ser suculento. Desta vez, também, fui aproveitando a gordura do bacon para fritar a linguiça, a da linguiça para suar a cebola roxa, o líquido formado para temperar e torrar a farinha (tirando cada elemento anterior e reservando, juntando tudo somente ao final). Depois mais um tiquinho de óleo só para assustar a couve com o alho, e aí juntar tudo e mais o feijão, acertando o sal e espalhando uma nuvem de salsa fresca. Ficou ótimo, para mim a receita definitiva desse prato de raiz, tão simples e saboroso, tão adequado aos finais de semana e outros dias de preguiça.

sábado, 15 de agosto de 2015

Kabuki e o pertencimento

Apesar da minha parcial japonesidad, nunca tinha assistido a uma apresentação de teatro japonês típico, Nô ou Kabuki. Minhas referências eram fotográficas ou musicais (Caetano falando de "kabuki, máscara" ou Gil citando o "teatro Nô, japonês").
Entonces, saindo da aula de fotografia, vi um cartaz com a programação de uma companhia japonesa de kabuki. E alguns dias depois lá estava eu, conferindo ao vivo o que os ancestrais fazem há quatro séculos.
No início, tive medo de que o público fosse desrespeitoso com uma cultura tão diversa como a japonesa, por mais que ela esteja popularizada na comida, nos animes, no karaokê. Algumas pessoas cochichavam, outras tossiam e uma meia dúzia saiu do teatro ainda na primeira parte da apresentação.
Quando anunciaram o intervalo, senti alívio, pois imaginei que era a oportunidade dos descontentes de saírem dali. Mas, para minha surpresa, a esmagadora maioria do público ali ficou, sem nem se levantar para o intervalo.
Havia, sim, trechos falados/cantados em japonês, que lembravam um pouco aquelas novelas japonesas transmitidas por algum canal nacional. Mas os gestos e a dança, valorizados pela luz e alguns efeitos simples e incríveis (como a teia de aranha feita de mil fios lançada pelo vilão), eram delicados, precisos, lindos. Fujima Kanjuro, despido de máscara e roupas extravagantes, envergando apenas kimono, elegantes calças hakama e meias, transformava a realidade ao redor com movimentos que pareciam mínimos, mas eram plenos de gestos e significados. Houve um momento em que me lembrei do flamenco, pelo girar das mãos, pela batida (muito mais contida, é verdade) dos pés no chão. Creio que, principalmente, pela intencionalidade.
De novo, de algum modo e emocionada, entendi tudo. Algo lá dentro dizia que aquilo pertencia a mim, que eu pertencia também àquela beleza.

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Pertencimento

Com essa história do sumiê retornam as questões de pertencimento. Quando vou à Liberdade (como hoje, quando fui à Livraria Sol para comprar um pincel), sempre tenho a sensação de fazer parte daquele universo oriental. Puxo papo com as vendedoras, senhorinhas japonesas que lembram minha mãe, e tenho certeza de que elas não entendem meu olhar enternecido. Mesmo sem falar japonês, sem partilhar de todos os costumes, uma centelha de mim reacende quando boto os pés ali. Talvez por isso o origami  e o judô, tão tardios, tenham parecido "naturais" quando aconteceram.
Também sinto o mesmo quando visito o Nordeste, claro. Parece que estou na sala de casa, tomando fresca com as portas abertas. Rio de felicidade, quase sentindo o vento no rosto, ao ouvir uma expressão conhecida desde a infância - "parado como um dois de paus", "malajambrado", "cabaré de asa", "sururu de capote". Fico muito, muito à vontade. E é essa sensação de estar à vontade na própria pele que eu chamo de pertencimento. Como é boa, como é fundamental!
Clarice Lispector tem um texto lindo sobre pertencer. Foi originalmente publicado no JB, como crônica, e depois na coletânea A descoberta do mundo. Ela diz que pertencer vem muitas vezes de sua força, e não de depender de alguém mais forte - deseja pertencer para que sua força "não seja inútil e fortifique uma pessoa ou uma coisa". Para não ficar com um presente embrulhado nas mãos sem ter a quem presentear. Não seria por acaso um dos aspectos da graça?
Ao final, Clarice fala, ao descobrir que pertencer é viver, de uma sede infinda, como quem, no deserto, bebesse as últimas gotas de água de um cantil. Aqui, agora, enquanto escrevo, imagino que viver/pertencer é mais como no deserto carregar um jarro d'água, que poderia derramar quando tropeçamos ou ir-se esvaziando quando damos de beber a alguém - mas, quase milagrosamente e ao mesmo tempo, vai se enchendo novamente da água trazida por outro passante. De forma abundante, até o fim.

domingo, 4 de março de 2012

Singularidades de um bairro - Liberdade

Domingo é dia da disputada feira da Liberdade. Tudo bem ficar de pé para comer guiozas ou bifum, debaixo do sol, se não quiser almoçar em algum restaurante típico. Depois é só tomar um Melona enquanto xereta as barraquinhas e lojas de cosméticos, de quinquilharias e artigos para casa. Ou comprar gulodices importadas dos Tigres Asiáticos nas mercearias da Galvão Bueno e rua dos Estudantes. Apreciar as belas flores e plantinhas vendidas por quem tem dedo verde, utensílios feitos de bambu ou patchwork caprichado. E curtir a simpatia de batians e ditians, sorridentes e sábios, uma fofura (impossível não me enternecer e pensar nos avós que não curti).
Ouvir músicos populares, tirar a sorte no realejo. Comprar mangás e papel para origami (que tal os da Livraria Sol?). Tomar um café acompanhado de um doce irreal de tão bonito, na confeitaria Alteza, ou um mais hardcore, grandão, da Bakery Itiriki. Namorar os lindos futtons e porcelanas na vitrine, admirar a variedade de luminárias e kimonos para todos os gostos e bolsos. Aliás, todos os gostos moram na Liberdade - que nome melhor para um bairro onde cabem todas as tribos?


Luminárias "ancestrais" convivem com linhas "modernas"; gente de toda parte passeia pela feira; lindo patchwork; ficar de pé para almoçar faz parte do programa; cores fortes em frutas e verduras (algumas identificadas somente por connaisseurs!); Liberdade para todos os gostos e sons (atenção à energia do cantor popular); um traço de passado no realejo; fofura do dia, o encantamento da garotinha diante do paso doble do pajarito que leu a sorte para nós.




Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

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